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Catherine Mackinnon sobre sexualidade e a distinção sexo/gênero

Se tem falado muito numa suposta distinção entre sexo e gênero. Se crê que o sexo é mais biológico e o gênero mais social, e a relação de cada um com sua sexualidade varia. Creio que a sexualidade é fundamental para o gênero e que é fundamentalmente social. A biologia se converte no significado social da biologia, dentro de um sistema de desigualdades sexuais, do mesmo modo que a raça se converte no étnico dentro de um sistema de desigualdades raciais. Ambas são sociais e políticas em um sistema que não se apoia independentemente em diferenças biológicas em nenhum sentido. Desde essa perspectiva, a distinção sexo/gênero se parece com a distinção natureza/cultura no sentido que criticava Sherry Ortner em “É fêmea para macho o que natureza é para cultura?” 1

O termo sexual se refere a sexualidade, não é a forma adjetivada de  sexo no sentido de gênero. A sexualidade não se limita ao que se faz por prazer na cama ou como ato reprodutivo ostentivo, e não se refere exclusivamente ao contato sexual, à excitação nem às sensações, nem termina no sexo-desejo, na libido nem no eros. A sexualidade se concebe como um fenômeno social muito mais amplo, nada menos que como a dinâmica do sexo entendido como hierarquia social, e seu prazer é a experiência do poder em sua forma com gênero. A valoração do potencial deste conceito para a análise da hierarquia social deve basear-se nesta idéia (que desenvolvo no capítulo 9). As relações entre o amor cortês e a guerra nuclear, os estereótipos sexuais e a pobreza das mulheres, a pornografia sadomasoquista e o linchamento, a discriminação sexual e a proibição do matrimonio homossexual e da mestiçagem parecem mais remotas se encerramos a sexualidade, mas não tanto se invade sem freio a hierarquia social.

 

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[1] tive que usar aqui essas duas palavras, macho e fêmea. Em inglês seria male e female, e acho que tem conotações distintas. É bastante importante para o feminismo radical e para os escritos de lésbicas separatistas a referência não à mulheres, mas à ‘female’, que em espanhol seria algo como hembra. Mas na maioria das traduções acho que não se traduz como fêmea female, e é bastante importante para debater a tentativa de desaparição conceitual de ‘mulheres’ por essencialismo, porque há uma experiência social desse corpo que determina o ser mulher social das mulheres nascidas mulheres.

 

 

(Catherine Mackinnon – Hacia una Teoría Feminista del Estado)