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Breve resenha de algumas teorias lésbicas – jules falquet

INTRODUÇÃO

 

Este trabalho procura sintetizar e dar a conhecer algumas teorias, reflexões e lutas das lésbicas e de seus movimentos em diferentes partes do mundo. Se origina em um primeiro texto escrito em francês para a rubrica “lesbianismo” do Dicionário Feminista recentemente publicado pelo grupo de investigação feminista GEDISST. Isto explica em parte seu estilo e seu caráter de “catálogo”, que apresenta correntes às vezes bastante opostas [1]. Aqui deixo de lado, consciente e propositalmente, muitos temas mais conhecidos, como a patologização e repressão do lesbianismo, e também grande parte das tendências insertadas no movimento homossexual misto.

Vinculando-se geralmente com lutas contra a Aids, e depois com reivindicações pelo “matrimônio” e a igualdade de direitos, estas tendências se marcam em uma defesa da “preferência sexual” e da “tolerância” e em uma busca de “reconhecimento” por parte da sociedade heterossexual. Se perfilam portanto como lutas pela liberdade individual e a integração, que, embora importantes, não questionam a fundo o sistema social.
Aqui quero na verdade resgatar elementos menos conhecidos que tendem a uma crítica radical, tanto da sexualidade em seu conjunto, como da heterossexualidade enquanto sistema político, e do sistema patriarcal, racista e classista imperante. Também quero assinalar que o presente texto se baseia sobretudo em grupos e reflexões vindas do mundo francófono por uma parte, norte-americano por outra, e também latino-americano e do Caribe. A história lésbica da Ásia, África e Oceania, deverá ser buscada em outras partes. Finalmente, devo também grifar que pela mesma situação política de hegemonia ocidental, tendem a ser produzidas mais teorias nos países do Norte e por parte de mulheres brancas, urbanas e de classe média, teorias que gozam de mais ampla difusão que as que se originam em

outras lésbicas, o que reflete este artigo e que não deixa de ser una limitação.

Neste texto então, que convida sobretudo à aprofundação, apresento seis pontos que buscam reconstruir certa ordem cronológica e afiamento político-lógico embora a custo de simplificações e arbitrariedades, como toda reconstituição a posteriori e desde uma posição de implicação no movimento. Primeiro, evoco a relatividade do que se chama “lesbianismo” e ao mesmo tempo, a importância de usar o termo “lésbica” frente a uma concepção geral-masculina da homossexualidade. Em um segundo momento, abordo os conflituosos laços do movimento lésbico com os movimentos homossexual e feminista, assim como os fundamentos teóricos do movimento lésbico autônomo que se forma progressivamente. A continuação, apresento outros desenvolvimentos da teoria e das lutas lésbicas, em especial as contribuições e questionamentos das lésbicas não-brancas e dos setores populares. Finalmente, evoco as teorias liberais “pró-sexo” e queer, que se perfilam mais bem como um retorno à posições fortemente influenciadas pelo pensamento masculino.

 

1. Variedade das práticas sexuais e amorosas entre mulheres e suas interpretações

Em diferentes culturas e épocas, há existido mulheres que se relacionam sexualmente, amorosamente e/ou afetivamente com outras mulheres. Os exemplos são dos mais variados. Se encontra uma larga lista de poetas, que em primeira pessoa deram testemunho de sua vivência lésbica, desde Safo, da antiga ilha de Lesbos, até a

afro-norteamericana Audre Lorde, falecida em 1993, que foi por sua vez teórica, militante e notável escritora (Lorde, 1982, 1984). Na India na época pré-védica,

se encontram mitos que falam do papel destacado das mulheres e esculturas muito explícitas de relações sexuais entre mulheres (Thadani, 1996). Em Zimbabwe, a

recém desaparecida Tsitsi Tiripano e o grupo lésbico-gay GALZ no qual militava, são uma prova fidedigna de que o lesbianismo existe em culturas africanas (Aarmo,1999). Em Sumatra, Indonésia, as tomboys são mulheres “masculinas” que estabelecem relações afetivas com outras mulheres (Blackwood, 1999). A antropologia por sua vez assinalou há muito o caso das e dos berdaches nas populações indígenas das planícies do norte do continente americano: são pessoas que, apesar de haver nascido homens ou mulheres, são consideradas socialmente como pertencentes ao sexo/gênero oposto e portanto buscam companheira de seu próprio sexo [2]. De forma mais geral, várias populações indígenas do continente manejam a noção de pessoas de “duplo espírito”, que muitas vezes possuem poderes mágicos-xamânicos e cujo comportamento sexual poderia ser visto como homossexual no marco das concepções ocidentais atuais (Lang, 1999).
Porém, cada sociedade constrói e interpreta essas práticas sexuais e amorosas entre mulheres de forma diferente, e sua visibilidade e legitimidade variam enormemente

segundo a concepção que cada sociedade tem do que é ser mulher ou homem, como o analiza a antropóloga francesa Nicole Claude Mathieu em um profundo artigo sobre a diversidade das formas de articulação entre sexo, gênero e sexualidade (Mathieu, 1991). De fato, há sociedades por exemplo que somente concebem a existência de

um gênero (o masculino), que logo se divide em dois sexos, como a sociedade africana !Kung! Por sua vez, a sociedade Inuit, próxima do círculo polar, atribui um(s) gênero(s) aos recém nascidos segundo aquele(s) ou aquela(s) pessoa(s) que nesta se reencarnaram : assim, uma bebê fêmea pode ser considerada socialmente como um homem, se nela regressa o espírito de seu avô. Porém, ao chegar à idade

reprodutiva, sofrem uma re-alocação social em seu sexo biológico, com vistas ao matrimônio reprodutivo. Em várias sociedades africanas, existe matrimônio entre mulheres, porém isso não significa que sejam lésbicas. Mais se trata de uma forma para mulheres mais velhas e relativamente ricas assegurarem uma descendência, obtendo-a da mulher mais jovem que tomam como esposa e que tem relações sexuais com homens para este fim.

Em meio a esta complexidade de arranjos culturais em torno ao sexo, ao gênero e à sexualidade, não é tão simples definir, nem o que é uma mulher, muito menos então o que é a heterossexualidade e a homossexualidade. Porém, na maioria das culturas hoje conhecidas e existentes, dominam arranjos sociais netamente patriarcais e baseados na heterossexualidade como norma obrigatória. Muitas religiões se encarregam além disso de condenar absolutamente tudo o que não serve explicitamente à reprodução. Portanto, as relações sexuais e amorosas entre mulheres são quase sempre por sua vez tabus, severamente condenadas e invisibilizadas. Daí que essas relações hajam sido muito pouco estudadas e muitas vezes deformadas e tratadas com pouca seriedade científica, como o exemplifica o caso das famosas Amazonas. Delas se há dito alternativamente que viviam na Grécia antiga ou na Amazônia, e se inventou toda classe de fantasias em torno a suas supostas formas de vida, mesclando essas mitificações com o estudo posterior das ferozes guerreiras do rei de Dahomey. Até hoje, nenhum estudo histórico sério demonstrou a existência das Amazonas, nem muito menos pode dar conta de suas práticas sexuais, apesar de que constituem um dos mais poderosos símbolos do lesbianismo.

Apenas recentemente, e no pensamento ocidental, é que se começa a atribuir às pessoas uma personalidade e identidade sexual específica e (relativamente) fixa, com base em suas práticas sexuais. Ainda assim, somente progressivamente se constituiu a categoria e o termo lésbica. Algumas historiadoras documentam a aparição do termo “tribadismo” para nomear as relações sexuais entre mulheres no começo do século XVIII (Bonnet, 1995). Já pela metade do século XIX, a medicina e sobretudo a psiquiatria nascente (seguida pela psicanálise) começam a interessar-se pelo que chamam o “terceiro sexo”, intervindo fortemente em sua categorização como “invertidas(os)” e sua patologização, e buscando sua “curação” (Lhomond, 1991).
A sexologia, que aparece nos finais do século XIX, continua esta tendência classificadora e normalizadora (Jaspard, 1997). Havelock Ellis, um de seus fundadores, desenvolve a hipótese de uma origem congênita da homossexualidade,

com a esperança de subtrair à(o)s homossexuais da repressão e das tentativas de curação. O modelo sexológico se complexifica ao incorporar elementos da psicanálise, igualmente determinista, embora já não localize a causa da homossexualidade na biologia senão que na Psicologia.

Basicamente, Freud interpreta a homossexualidade feminina como uma simples simetria da homossexualidade masculina e uma prova de “imaturidade” no desenvolvimento psicossexual das mulheres. Simultaneamente, na Europa, nos anos

vinte e trinta, as lésbicas se fazem bastante visíveis: em Paris, o célebre casal norteamericano que une Gertrude Stein e Alice Toklas organiza círculos literários no

bairro artístico de Montparnasse. Em Berlim se multiplicam os lugares de sociabilidade lésbica antes de que o fascismo arrasasse com tudo, assassinando ou obrigando ao exílio ou à clandestinidade às lésbicas e homossexuais. Em Londres,

Radclyffe Hall publica sua célebre obra “O Poço da Solidão” que lhe custará a violenta condenação da sociedade bem pensante [3] (Tamagne, 2000). Por outro lado, na França a literatura heterossexual e a indústria da moda popularizam o ambíguo personagem de la garçonne, mulher “moderna” de cabelo curto e moralidade desafiadora, mas que em si mesma não necessariamente é lésbica.

2. Lésbicas ou “homossexuais femininas”?

Embora muitas vezes se usem de forma relativamente indistinta os termos “lésbica”, “homossexual feminina” ou “mulher gay”, existe um debate político em torno ao tema, derivado da reflexão feminista. De fato, a palavra homossexual se refere a um

conjunto de práticas sexuais, amorosas, afetivas, entre dois ou mais pessoas do mesmo sexo. Estas práticas individuais, se vêm a ser publicamente conhecidas, geralmente levam à estigmatização e à repressão. Podem ser dadas a conhecer publicamente em forma voluntária pelas pessoas envolvidas, por meio do coming out

ou “saída do armário”, e assim desembocar em “identidades” orgulhosamente reivindicadas. Assim como a palavra gay, o termo da homossexualidade tem a vantagem de marcar uma diferença com a população heterossexual e assinalar que aquelas e aqueles que se relacionam sexualmente ou amorosamente com pessoas de seu mesmo sexo têm uma vivência diferente de quem se apega à norma social da heterossexualidade. Porém, o paralelismo que estabelece o termo “homossexual” ou gay com a situação dos homens é muito redutor e enganoso. O feminismo demonstrou amplamente que a opressão patriarcal coloca as mulheres em uma posição social estruturalmente muito diferente da dos homens em quase todas as culturas que se conhecem. Para viver seu corpo, exercer sua sexualidade e simplesmente, viver, as mulheres se encontram em condições bastante menos vantajosas que os homens, embora sejam estes homossexuais. Usar o termo “lésbica”, portanto, permite evitar a confusão entre práticas que se bem são todas homossexuais, não têm em absoluto o mesmo significado, as mesmas condições de possibilidade nem sobretudo o mesmo alcance político segundo o sexo de quem as leva a cabo.
É assim na França por exemplo, se usa pouco o termo gay para referir-se às mulheres, e embora seja certo que ultimamente, a palavra lésbica passou na linguagem comum a designar às mulheres homossexuais, inicialmente seu uso foi especialmente reivindicado pelo movimento lésbico feminista para sublinhar o sentido coletivo e político de ditas práticas. Neste contexto, a palavra lésbica se refere a um lesbianismo político, que se planteia como uma crítica em atos e um questionamento teórico ao sistema heterossexual de organização social.
Segundo a análise lésbico-feminista, dito sistema heterossexual descansa sobre a estrita divisão da humanidade em dois sexos que servem de base para construir dois gêneros rigorosamente opostos e forçados a manter relações muito desiguais de “complementariedade”. Esta “complementariedade” não é outra coisa que a justificação de uma divisão sexual do trabalho rígida, que se baseia em uma

impiedosa exploração das mulheres, no âmbito doméstico, laboral, reprodutivo, sexual e no psico-emocional. Neste sentido, ao problematizar e criticar o sistema heterossexual, o lesbianismo em sua dimensão política questiona profundamente o sistema dominante, representa uma ruptura epistemológica fundamental e convida à uma revolução cultural e social de grande alcance.

 

3. Movimento lésbico, movimento homossexual e movimento feminista

O lesbianismo como movimento social aparece em finais dos 60, no mundo ocidental e em muitas metrópoles do Sul. Nasce em uma atmosfera de prosperidade econômica e de profundas mudanças sociais e políticas que incluem tanto o desenvolvimento da sociedade de consumo e a “modernidade” triunfante, como a descolonização e um auge das mais variadas perspectivas revolucionárias. Embora haja sido bastante menos estudado que o movimento dos direitos civis, negro, indígena, estudantil ou de mulheres, é um dos chamados “novos movimentos sociais” que surgem na época, desbordando as organizações de corte classista que dominavam até aquele momento. O movimento lésbico se desenvolve em estreita vinculação ideológica e organizativa com outros dois movimentos muito fortes: por um lado, o movimento feminista chamado de “Segunda Onda”, e por outro, com o movimento homossexual, que se vai construindo rapidamente depois da “insurreição urbana” de 1969 em Stonewall (“insurreição” que responde a uma provocação policial em bares homossexuais de Nova Iorque, e que hoje é celebrada cada ano ao redor do mundo com as manifestações do “orgulho lésbico e gay”).
Porém, progressivamente, o movimento lésbico se vai autonomizando. Por um lado, em diferentes países se repete a mesma experiência: como mulheres, as lésbicas não

tardam em criticar a misoginia, o funcionamento patriarcal e os objetivos falocêntricos do movimento homossexual, dominado por homens (Frye, 1983; Mogrovejo, 2000). Armadas da crítica feminista, explicam publicamente seus

desacordos e fundam suas próprias organizações, como as Gouines Rouges (algo como “Sapatões Vermelhas”) na França. Por outro lado e de forma mais ou menos simultânea, como mulheres homossexuais, muitas lésbicas não terminam de sentir-se

plenamente identificadas com o movimento feminista. Melhor dizendo, o movimento feminista constitui para elas, a princípio, um espaço muito importante no qual lutar e encontrar mulheres que, como elas, combatem os estereótipos e limitações sociais associados à feminilidade, e a opressão das mulheres. Também constitui um bem-vindo lugar de encontro com outras lésbicas, favorável à elevação de sua auto-estima e a sua “saída do armário”. Portanto, muitas lésbicas contribuem muito ativamente à construção do movimento feminista, do qual a princípio se sentem totalmente aparte, seja como pessoas ou como grupos lésbicos. Porém, se vão dando conta com o tempo que algumas feministas as percebem como um questionamento ameaçador a sua posição heterossexual ou a seu lesbianismo “no armário”, o que muitas vezes provoca tensões inter-pessoais. Sobretudo, coletivamente, boa parte do movimento feminista se deixa intimidar pela mensagem social que exige ao feminismo silenciar, invisibilizar e postergar ao lesbianismo para ser minimamente respeitado. Enquanto que as lésbicas lutam por todas as causas das mulheres, mesmo aquelas que não as atingem diretamente (por exemplo, para a anticoncepção ou a interrupção voluntária da gravidez), as demais mulheres se mostram geralmente muito mornas no momento de lutar por causas lésbicas ou questionar a heterossexualidade (CLEF, 1989). Algumas lésbicas começam então a buscar uma via própria, gerando espaços

autônomos de fazer político lésbico.

4. Afirmação teórica do Movimento Lésbico

Frente a este duplo desafio, em finais dos 70, se vão multiplicando os análises teóricos especificamente lésbicos, especialmente desde uma aprofundação das reflexões feministas. Duas grandes pensadoras disparam a reflexão1, em ordem de idéias um pouco diferentes.
Por um lado, a poeta norte-americana Adrienne Rich abre uma profunda brecha com seu famoso artigo “Compulsory Heterosexuality and Lesbian Existence” (Heterossexualidade Obrigatória e Existência Lésbica), publicado em 1980 pela revista feminista Signs (Rich, 1980). Nele, Rich denuncia a heterossexualidade forçada enquanto norma social que exige e causa a invisibilização do lesbianismo, inclusive no mesmo movimento feminista.

Enfoca o lesbianismo na perspectiva de um “contínuum lésbico” que une a todas as mulheres que de uma ou outra forma se afastam da heterossexualidade e tentam criar ou reforçar os vínculos entre mulheres, compartindo suas energias na perspectiva da luta contra o sistema patriarcal. Tendo também refletido em outras ocasiões sobre a maternidade e os laços mãe-filhas e filhos em seu livro “Of Women Born” (Nascida de mulher), assim como sobre o racismo entre mulheres e entre lésbicas, Rich aponta a construção de uma verdadeira “sororidade” feminista, não “natural” e ingênua, senão que voluntária e claramente política, que dá cabida a todas, tanto lesbianas como heterossexuais e bissexuais, na luta pela libertação comum. Assim é como afirma, há quase vinte anos:

“É fundamental que entendamos o feminismo lésbico em seu sentido mais profundo e radical, como sendo o amor por nós mesmas e por outras mulheres, o compromisso com a liberdade de todas nós, que transcende a categoria de ‘preferência sexual’ e a de direitos civis, para tornar-se em uma política de formular perguntas de mulheres, que lutam por um mundo no qual a integridade de todas — e não de umas poucas eleitas — seja reconhecida e considerada em cada aspecto da cultura.” (Rich, 1983).

Por outro lado e quase simultaneamente, a francesa Monique Wittig, radicada há já uns anos nos Estados Unidos, elabora una reflexão bastante inovadora que questiona as bases mesmas da análise feminista.
Enunciado já em uma conferência realizada em 1978 nos Estados Unidos, sua análise é publicada em francês em 1980 pela revistaQuestions Féministes, em dois artigos fundadores: “On ne naît pas femme” (Não se nasce mulher) e “La pensée straight” (O pensamento heterossexual2). Mais além do sistema patriarcal, Wittig planteia a existência de um regime político ainda mais central, que é a heterossexualidade, cujo eixo ideológico é precisamente o que ela chama “O pensamento Straight/Hetero” (Wittig, 2001). Sua análise está firmemente ancorada no feminismo materialista francês, dado que retoma a noção de “classes de sexo”, que faz das mulheres e homens categorias políticas que não podem existir uma sem a outra [4]. Explica:

“Além disso, ‘lésbica’ é o único conceito que conheço que está mais além das categorias de sexo (mulheres e homens), porque o sujeito designado (lésbica) não é uma mulher, nem no sentido econômico, nem no político, nem no ideológico. Porque de fato, o que constitui uma mulher, é uma relação social específica a um homem, relação que outrora estivemos chamando por ‘servaje’ [5], relação que implica obrigações pessoais e físicas, tanto como obrigações econômicas (assignação à residência, tediosas tarefas domésticas, dever conjugal, produção ilimitada de filhos e filhas, etc.), relação da qual escapam as lésbicas, ao negarem-se a tornar-se ou serem heterossexuais. Somos fugitivas da nossa própria classe, da mesma maneira que as e

os escravos norte-americanos o eram quando escapavam da escravidão e se tornavam mulheres e homens livres. Quer dizer que para nós é uma necessidade absoluta: nossa sobrevivência exige contribuir com todas nossas forças para a destruição da classe das mulheres que é apropriada pelos homens. E isso somente pode ocorrer por meio da destruição da heterossexualidade como sistema social, baseado na opressão e apropriação das mulheres pelos homens, que produz um corpo de doutrinas sobre a diferença entre os sexos para justificar esta opressão”.

Com esta reflexão, Wittig senta as bases de uma teoria lésbica autônoma, abrindo caminho para um poderoso caudal de análises e práticas políticas que desembocam na constituição de um verdadeiro movimento lésbico, no qual em alguns casos se separa do feminismo. Por exemplo na França, suas afirmações nutrem os cruéis debates que já haviam começado dentro do movimento feminista, originados, entre outro, por um novo grupo lésbico criado em 1979, Les lesbiennes de Jussieu (As lésbicas da

[universidade] de Jussieu) e que desembocam em uma ruptura política bastante dura apartir de 1980, com a aparição do movimento que será conhecido como o das lésbicas separatistas.
De maneira mais geral, o “lesbianismo político” nasce em diferentes partes e épocas, das rupturas e ao mesmo tempo das tentativas de conciliação com o feminismo.

Portanto, se apresenta sob formas e denominações bastante variadas, às vezes misturadas e difíceis de separar cabalmente. A dificuldade é ainda maior se tomamos em conta a forma em que as teorias viajam de um país a outro, com traduções às vezes aproximadas — dado que um mesmo termo como “radical” ou “separatista” tem conotações muito diferentes segundo os idiomas e sobretudo a história das lutas em cada país —.
Aqui a grandes rasgos e simplificando reflexões bastante complexas, distinguiremos três grandes correntes: o lesbianismo feminista, o lesbianismo radical e o lesbianismo separatista.

O primeiro, o lesbianismo feminista, critica o heterofeminismo por sua falta de reflexão sobre a questão da heterossexualidade, mas não deixa de insistir na necessária solidariedade política das mulheres (como classe de sexo) e na objetiva convergência de interesses que as une a todas contra o heteropatriarcado (Green, 1997). A análise da lesbofobia como uma arma contra o conjunto das mulheres se vincula com essa posição (Pharr, 1988). Efetivamente, embora se centre externamente sobre “os modais” e a aparência, a lesbofobia defende interesses

econômicos masculinos muito concretos no marco da divisão sexual patriarcal do trabalho. Serve por exemplo contra todas as mulheres, que, independentemente

de suas práticas sexuais, aspiram ter acesso próprio aos meios de produção ou a exercer profissões “masculinas” (ou seja: melhor remuneradas ou que levem a ter poder), e que podem ser acusadas em qualquer momento de ser lésbicas e assim condenadas a um verdadeiro ostracismo social.

O lesbianismo radical — tendência marcadamente francófona que se articula em torno ao pensamento de Monique Wittig e da revista quebequense Amazones

d’Hier, Lesbiennes d’Aujourd’hui (AHLA, Amazonas de Ontem, Lésbicas de Hoje [6])— por sua parte, retoma entre outros os trabalhos da feminista materialista francesa Colette Guillaumin sobre o “sexaje” (Guillaumin, 1992), para articular progressivamente uma análise mais complexa da opressão das mulheres. Para esta corrente, as lésbicas certamente escapam à apropriação privada por parte dos homens, mas não se livram da apropriação coletiva, o que as vincula à classe das mulheres e implica lutas conjuntas (Turcotte, 1998, Causse, 2000).
O lesbianismo separatista, finalmente, é teorizado desde 1973 nos Estados Unidos por Jill Johnston3 (Johnston, 31:1973). Tem expressões e conotações bastante diversas segundo os países, mas no geral desemboca na criação ou toma de espaços físicos ou simbólicos por e para lésbicas unicamente, seja se as separatistas criam comunidades ou comunas em casas ocupadas ou no campo, seja se organizem festivais de cinema ou de música, revistas, casas editoriais ou espaços de sociabilidade e de luta política. Ao igual que no feminismo, algumas de suas seguidoras beiram o essencialismo, outras se orientam para a recuperação das deusas e à busca de uma espiritualidade diferente, enquanto que outras se dedicam à criação de grupos políticos.

Fundamentalmente, todas lutam para a (re)criação de uma cultura e de uma ética lésbicas (Hoagland & Penelope, 1988; Hoagland, 1989, Demczuk, 1998).

Todas essas diferentes tendências, muitas vezes mescladas na prática cotidiana, comporão o movimento das lésbicas, com grupos tão diversos como Oikabeth (“Mulheres guerreiras que abrem caminhos e espalham flores”) que começa em 1977 no México, ou o Coletivo Ayuquelén, fundado em 1984 no Chile, durante a ditadura (Mogrovejo, 2000), as Entendidas em 1986 em Costa Rica, ou os Arquivos de pesquisa e cultura lésbica em Paris. Rapidamente, este movimento busca formas de

articulação internacional, entre as quais destacam-se a Frente Lésbico Internacional, criado em 1974 em Frankfurt, ILIS (Sistema de Informação Lésbica Internacional), criado em 1977 em Amsterdam, ou desde 1987, os encontros lésbico-feministas latinoamericanos e do Caribe — enquanto que os grupos lésbicos asiáticos estão organizando diversas redes na década seguinte. Os anos 80 em especial estão marcados por um auge do movimento lésbico, com o florescimiento de revistas, eventos, marchas, lugares de encontro, e inclusive de “arquivos lésbicos”, que começam a constituir uma memória do movimento, desde México até Moscou, passando por Nova Iorque.

5. Multiplicidade de lésbicas
Simultaneamente, aparecem uma série de críticas à hegemonia do modelo lésbico (e feminista) branco, ocidental e de classe média, tanto desde o incipiente meio acadêmico de estudos lésbicos, como desde os grupos ativistas.

No âmbito universitário, onde o lesbianismo é principalmente abordado desde a história e a literatura, começam a se desenvolver pesquisas sobre as “amizades

românticas” entre mulheres do século XIX (Faderman, 1981), resgatando-as como vínculos políticos e desafio à moral vigente, em épocas em que nem sequer o feminismo se atrevia a questionar a heterossexualidade. Porém, muitas vezes, as protagonistas desta valiosa história são mulheres ocidentais e de classe média-alta. Desde outro ângulo, há lésbicas que querem escrever uma história mais ampla,

com perspectivas de classe e de “raça” [7]. Por um lado, aparecem trabalhos que enfatizam a grande contribuição das lésbicas proletárias e não necessariamente brancas à construção de verdadeiras comunidades lésbicas, muito antes da década dos 70, quando entra em cena o feminismo da segunda onda, dominado por mulheres de

classe média vivendo em grandes cidades. Um exemplo disso é o estudo de Davis e Kennedy sobre a comunidade lésbica da provinciana cidade de Buffalo, nos anos

50, nos Estados Unidos (Davis & Kennedy, 1989). Muitas dessas comunidades funcionavam em meio bastante hostil das pequenas cidades e dos bares populares.

Ali defendiam uma visibilidade relativa com base nos códigos amorosos e sociais de butch e femme (dizendo-se butches às lésbicas ‘masculinas’ (Feinberg, 1993 ; Triton, 2000) e femmes às “femininas” (Nestle, 1981). Embora o feminismo desde os anos 70 tenha criticado estes papéis como uma reprodução da heterossexualidade, que já não são necessários nem desejáveis desde a utopia feminista, nas décadas posteriores são de novo reivindicados, tanto no sul como no norte. Suas defensoras os apresentam como uma forma de existência e visibilização bastante valente — sendo as butches um desafio evidente ao monopólio masculino sobre as mulheres e sobre certas maneiras de comportar-se, vestir-se, etc.—. Também insistem que se trata de uma forma deliberada de jogo, burla e subversão dos códigos masculinos e femininos heterossexuais, demasiadamente perfeitamente arbitrários. Sobretudo, afirmam que esta maneira de viver lhes agrada e corresponde a uma busca erótica que afirma, sem complexos, a dimensão sexual do lesbianismo (Lemoine & Renard, 2001). Nesta mesma ordem de idéias, algumas lésbicas reivindicam o termo dyke [8] , bastante depreciativo em sua origem, não apenas como uma forma de escapar à imagem “lisa e limpa”, classe-média e aceitável, das lésbicas, senão que também por suas conotações populares, como é também com o termo Jules na França.

Muitas vezes também proletárias, várias feministas e lésbicas negras dos Estados Unidos começaram a criticar o racismo e o classismo do feminismo desde os anos

70, fundando algumas delas, como Barbara Smith, organizações autônomas, entre as quais Salsa Soul Sisters e Combahee River Collective, localizado em Boston. Este último, que constitui desde 1974 um grupo político pioneiro, produz em 1977 a muito importante Declaração Negra Feminista. Nela, afirma seu compromisso de lutar

“contra a opressão racial, sexual, heterossexual e classista”. Agrega que “Como negras vemos o feminismo negro como o lógico movimento político para combater as opressões simultâneas e múltiplas às que se enfrentam todas as mulheres de cor” (Moraga, Anzaldúa, 1981).
Em 1979, por iniciativa de duas “Chicanas”, Glória Anzaldúa e Cherrie Moraga, nasce o projeto de um livro que recolha as experiências e vozes, e permita unir e visibilizar ao conjunto das mulheres e lésbicas “de cor” dos Estados Unidos. Ali, negras, indígenas, asiáticas e latinas, assim como imigrantes e refugiadas, afirmam sua impossibilidade de escolher entre sua identidade como mulheres e como pessoas de cor.

Denunciam o sexismo e a lesbofobia dos movimentos progressistas e anti-racistas, mas também o racismo e o classismo que se manifestam no movimento feminista

e lésbico — no qual as mulheres brancas, “anglo” ou “caucasianas” as quiseram ter caladas (Moraga, Anzaldúa, 1981; Lorde, 1984). Para que sua palavra não siga negada nem apropriada, criam suas próprias estruturas editoriais, tal como Kitchen Table Press, fundada entre outras por Barbara Smith, Cherrie Moraga e Audre Lorde, que se dedica a publicar exclusivamente trabalhos de feministas e lésbicas de cor (Smith, 1983).

Pouco a pouco, não apenas como feministas senão que especificamente como lésbicas, várias mulheres não brancas afirmam sua existência e suas lutas, seja como lésbicas, negras, black ou afro (Clarke, 1986, Mc Kinley & De Laney, 1995 ; Curiel, 2000), como lésbicas asiáticas (Mason-John, 1995), latinas, originárias ou judias (Bulkin, 1988; Torton Beck 1989; Balka & Rose, 1991). Mutas delas, em seu acionar

político, estão fortemente comprometidas com correntes feministas revolucionárias e “socialistas” [9], com as lutas contra o racismo, nos movimentos anti-imperialistas, e com os grupos de bairros e comunitários que brigam de maneira muito concreta contra os efeitos conjuntos da opressão racista, de classe e de sexo. De fato, muitas se afastam do separatismo lésbico, ao considerar que não podem desligar totalmente suas lutas daquelas das mulheres heterossexuais e dos homens de suas comunidades.

Mais recentemente, em parte dentro do marco do pós-modernismo que critica o sujeito universal, e com uma reflexão sobre o pós-colonialismo, existem notáveis

tendências que continuam a reflexão sobre as identidades culturais múltiplas das lésbicas. Atualmente, em um mundo bastante “globalizado”, muitas lésbicas criticam certa tendência universalista que consiste em projetar sobre o conjunto das lésbicas uma leitura do lesbianismo e uns objetivos de luta bastante ocidentais e classe-medistas.

Certamente, existem práticas sexuais entre pessoas que possuem um “corpo sexuado feminino” em culturas tão diferentes como as de Lesotho, Tahiti, Perú e Tailândia (Wieringa, 2000). Mas classificá-las sistematicamente — desde fora — de práticas lésbicas, muitas vezes constitui uma simplificação reducionista, sobre a qual pesa uma legítima suspeita de pós-colonialismo. Na França e com uma perspectiva bastante crítica, o “Grupo de 6 de novembro”, fundado em 1999, reúne pela primeira vez exclusivamente lésbicas provenientes das imigrações passadas ou presentes, da escravização e da colonização, que denunciam com força o racismo do movimento lésbico francês (Groupe du 6 novembre, 2001).
Com todos seus componentes, a visibilidade dol lesbianismo foi crescendo de uma maneira até então inimaginável, entre outros, ao criar-se vários espaços de convergência internacional. Muitas vezes, as lésbicas vieram aproveitando eventos convocados pelo movimento gay misto para organizar atividades próprias, como a marcha de centenas de centenas de lésbicas que teve lugar em Nova Iorque para os 25 anos deStonewall em 1994, ou os debates de lésbicas durante eventos esportivos como os Gays games em Amsterdã de 1997. Também criam espaços próprios em eventos de mulheres como a Conferencia Mundial sobre a Mulher de Beijin em 1995, e em eventos meramente feministas como os Encontros Feministas Latino-americanos e Caribenhos. Em Latinoamérica e Caribe, apesar de muitas dificuldades ligadas à repressão lesbofóbica, já foram realizados cinco Encontros lésbico-feministas continentais, em México, Costa Rica, Porto Rico, Argentina e Brasil [10].

Ao mesmo tempo em que o movimento se desenvolve e se internacionaliza, grandes organizações como ILIS e sua organização irmã mista ILGA (International Lesbian and Gay Association, Associação lésbica e gay internacional, com estatuto consultivo na ONU) puderam ser criticadas por sua tendência a exportar estratégias organizativas e de ação — bastante institucionais — dos países do Norte em muitos países do Sul (Mogrovejo, 2000). De fato, é notável que ao mesmo tempo em que se desenvolveu o movimento, se institucionalizou consideravelmente. Seus conteúdos estiveram se homogenizando bastante e vieram perdendo radicalidade, constituindo-se em uma sorte de linha geral que parte da luta contra a Aids e se articula agora em torno da reivindicação da liberdade de “preferência sexual [10]”, da “diversidade” e do “matrimônio gay”, no marco da tolerância e da integração social. Isso se pode analisar em parte como sendo o efeito de uma nova aproximação às posições e interesses dos homens gays, ao mesmo tempo que como o resultado das influências das organizações financiadoras do Norte, das quais as novas “instituições” lésbicas se tornaram cada vez mais dependentes, e sobretudo no marco de uma direitização social general.

6. “Revolução Sexual”, Retorno ao gênero, pós-modernismo e despolitização

Os anos 80 são, nos Estados Unidos, marcados pela crise econômica e o reforçamento do moralismo mais conservador, simbolizado pelo desenvolvimento do movimento “Pró-vida” (anti-abortista, mas também anti-feminista e extremadamente lesbofóbico). É a época do auge do movimento lésbico (feminista, separatista ou radical), e ao mesmo tempo de uma “segunda revolução sexual” que desde este mesmo movimento lésbico, se pode ler mais precisamente como um retrocesso teórico e prático, com um retorno ao pensamento masculino-gay e uma releitura

despolitizante do conceito de gênero.
No interior do movimento feminista, estala um forte debate, cujo ponto álgido é a Conferência anual de Barnard College de 1982, que se propunha analisar a

“política sexual” do movimento. Por um lado, se desenvolve uma linha “liberal” em torno à sexualidade, com reflexões como a de Gayle Rubin. Segundo sua análise, o problema radica na hierarquização das sexualidades, situando-se arbitrariamente no ápice a heterossexualidade reprodutiva e monogâmica, enquanto que as sexualidades “desviadas” são discriminadas e condenadas. Desde este ponto de vista, o importante é conseguir uma aliança de todas as “minorias sexuais” que de uma ou outra maneira subvertem a heterossexualidade (Rubin, 1984). Este análise reduz uma vez mais o lesbianismo à sexualidade, e a sexualidade lésbica a uma sexualidade “diferente” entre muitas. Ou seja, se desvincula totalmente o questionamento político global da sociedade originalmente proposto desde o lesbianismo feminista, radical ou separatista.

Indo ainda mais longe nesta direção “pró-sexo” liberal, algumas lésbicas como Pat Califia e o grupo S/M Samois não duvidam em reivindicar abertamente o sadomasoquismo lésbico como uma maneira de empoderar-se por meio da sexualidade (Califia, 1981 y 1993 ; Samois, 1979 y 1981). Numerosas lésbicas e feministas denunciaram vigorosamente esta tendência como anti-feminista, por basear-se na tradicional erotização patriarcal da violência e da dominação. Audre Lorde por exemplo afirma : “Como mulher pertencente a uma minoria, sei perfeitamente que a dominação e a submissão não são temas próprios do dormitório.” (Lorde, 1984). Sem recusar nem a sexualidade, nem a busca do prazer, nem o erotismo (Lorde, 1993), com ela, várias autoras consideram que voltar a reger-se novamente por padrões de conduta sexual típicamente masculinos — e gays — apresentados como o “verdadeiro sexo quente”, demonstra uma queda da auto-estima das lésbicas, que há anos se propunham muito mais uma busca sexual diferente, e congruente com suas aspirações feministas. Colocam que o uso da pornografia e prostituição, embora sejam “lésbicas”, somente reforçam um imaginário patriarcal e multiplica as ambições da indústria do sexo, conduzindo por fim à exploração de mulheres e lésbicas por outras lésbicas (Jeffreys, 1996).
A esta primeira tendência, se une outra, com origens distintos — não a análise da sexualidade senão que do gênero — mas com bastante concordâncias: o pensamento queer4 (estranha/estranho), popularizado pela norte-americana Judith Butler e a italiana estabelecida nos Estados Unidos Teresa de Lauretis5.
Com forte influência pós-modernista e do pensamento gay e psicaanalítico, Butler afirma que o gênero seria uma “performance”, algo fluido, modificável e múltiplo, o que permitiria às mulheres “jogar” sobre um registro identitário variado e modificável (Butler, 1990). As e os “transgêneros”, as e os travestis, as e os transsexuais, os drags-kings e as drags-queens [12], e inclusive as e os heterossexuais dissidentes viriam a romper a trágica bipolaridade dos gêneros e a questionar sua “naturalização” [13]. Existem algumas confluências entre parte do movimento queer e as contribuições das lésbicas e feministas não-brancas, na medida em que ambas correntes possuem interesse na crítica pós-modernista do sujeito “universal” do pensamento “moderno”, que esconde exclusivamente os interesses dos homens brancos, heterossexuais e economicamente privlegiados (hooks, 1990). De Lauretis, por sua vez, faz uma reflexão desde a semiótica da imagem cinematográfica, e conceitua neste marco às lésbicas como “sujeitos ex-cêntricos “, capazes de lançar um olhar novo sobre o mundo. Na França, o primeiro grupo queer, o ZOO, formado en 1998, se inspira em Butler e trabalha a sua difusão e tradução ao francês (Bourcier, 2001 ; Preciado, 2000).
Embora o movimento queer em si não se destaque por seu caráter militante ou de rua, tem um duvidável eco ideológico, por exemplo se medimos pela multiplicação das lésbicas que querem lutar com outras “minorias sexuais”, como o atestam as referências cada vez maiores a um movimento “LGBT” (Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgênero ou Transexuais). Porém, existe uma forte crítica feminista, como a que expôe magistralmente Sheila Jeffreys, que assinala que a perspectiva queer, bastante influenciada por imaginários sexuais e sociais masculinos e sua concepção da “liberação sexual”, tem conotações profundamente individualistas e idealistas que deixam incólumes as bases materiais da exploração, em especial da exploração das mulheres (Jeffreys, 1996). Como o escreve Barbara Smith:
“As e os ativistas queer trabalham sobre questões queer e os temas do racismo, opressão sexual, e exploração econômica não parecem interessar-lhes, apesar do fato de que a maioria das pessoas queerssejam gente de cor, mulheres e de classe trabalhadora. Quando mencionam outras opressões ou outros movimentos, é para construir um paralelismo que sustente a validez dos direitos lésbicos e gays, ou para pensar em alianças com organizações “respeitáveis” [mainstream].6Construir coalições unificadas hoje, que desafiem o sistema e em última instância preparem o caminho para uma mudança revolucionária, simplesmente não é o que as e os ativistas queer têm em mente.” (Smith, 1998).
Para concluir esta apresentação de diferentes linhas de pensamento lésbico, devo sublinhar que a realidade é muito mais complexa e que as influências recíprocas e as

misturas ideológicas múltiplas fazem bastante difícil uma definição unívoca dos grupos e movimentos. Embora sem dúvida tenha ocorrido uma acumulação de força e uma aprofundação teórica e prática do movimento lésbico com o passar de mais de quatro décadas, cada corrente perde e ganha força em ritmos diferentes e na atualidade todas co-existem, as vezes em contexto de unificação ideológica, e de persistência de profundas diferencias políticas, que se originam tanto em realidades cotidianas bastante diferentes, como em utopias divergentes.
Hoje, o lesbianismo como movimento e sobretudo como forma de vida, aflora por todas partes, cada vez mais complexo e variado. Possui — de forma mais ou menos aberta — lugares de sociabilidade e de diversão, espaços culturais e artísticos, uma importante literatura e meios de comunicação próprios, alguns espaços nas margens da instituição universitária, assim como redes políticas que se desenvolvem principalmente no marco de estratégias de visibilidade e de identidade. Essa tendência “comunitária” foi porém criticada, as vezes por seu caráter encerrador, as vezes como a expressão de um modelo gay por demais influenciado pelo movimento homossexual masculino, e outras vezes ainda como uma política reformista de institucionalização que leva à recuperação do movimento e à sua neutralização ou normalização.

A luta contra a Aids contribuiu para reforçar a organização das lésbicas, mas sobretudo muitas vezes as induziu a se aproximar novamente do movimento homossexual misto, no qual muitas vezes desaparece sua problemática própria. Em certos países ou cidades do Norte e do Sul que se contam com os dedos das mãos, foram conquistadas algumas legislações progressistas, que proíbem a discriminação por “orientação sexual” ou que reconhecem a união entre mulheres e concedem algumas das vantagens próprias da união heterossexual — embora os temas da adoção e da procriação seguem sendo problemáticos. Na França, oPACS (Pacto de união civil) foi ganho pela pressão da luta homossexual mista — na qual se destacaram as lésbicas —, enquanto que a Coordenação Nacional Lésbica (feminista e não mista) propunha uma lei específica contra a lesbofobia. No México e no Brasil, entre outros, se seguem caminhos semelhantes. Se pode a respeito falar de conquistas, mas também se pode analisar como um progressivo processo de integração social, no marco de uma despolitização geral em um mundo cada vez mais individualista,

capitalista e racista. A extensão da “cidadania” às lésbicas, aos gays, às mulheres, às pessoas negras ou indígenas pode ser vista como um objetivo de luta para a

aprofundação da democracia, tanto como uma maneira por parte do sistema de integrar e tornar leais novas capas da sociedade a um projeto neoliberal em profunda crise de legitimidade. Em todo caso, essas evoluções não devem fazer esquecer o caráter profundamente radical, subversivo e transformador de algumas propostas políticas lésbicas. Como escreviam as Radicalesbians de Nova Iorque em 1970: “A lésbica é a fúria de todas as mulheres concentrada até o ponto de explosão!”, ou a da lésbica negra Cheryl Clarke que afirma que “Ser lésbica em uma cultura tão supremacista-machista, capitalista, misógina, racista, homofóbica e imperialista como a dos Estados Unidos, é um ato de resistência — uma resistência que deve ser acolhida através do mundo por toda as forças progressistas” (Clarke, 1988).

Hoje, a feminista chilena Margarita Pisano nos interpela:
“Sem repensar um movimento lésbico, político e civilizatório, não poderemos desarticular o sistema. Sem um olhar crítico, não saberemos se é desde dentro do próprio movimento lésbico que estamos traindo nossas políticas e nossas potencialidades civilizatórias. Que custos teve essa sucessão de súplicas à maquinaria masculinista para que nos aceite e nos legitime?”

Finalmente, é preciso lembrar que em geral, o desenvolvimento do lesbianismo foi acompanhado dos avanços e retrocessos da situação das mulheres. Certamente,

houve algumas evoluções favoráveis, mas também retrocessos profundos: a miséria e a exploração das mulheres aumentou mais que nunca na história, sobretudo nos países do Sul, as religiões patriarcais foram reforçadas consideravelmente e o militarismo guerreirista domina. Seria um grave erro esquecer que muitas mulheres no mundo não estamos livres nem felizes e que, em muitíssimos lugares e em especial longe das grandes cidades, o lesbianismo segue sendo tabu, reprimido, perseguido, duramente castigado, e pode inclusive ser pretexto para o simples e vil assassinato. Portanto, resta bastante luta por diante.

Notas

[1]. Se coloca aqui uma dificuldade de tradução lingüística e política-cultural. Por exemplo, os diferentes térmos que uso neste artigo, às vezes sem aspas, como radical ou feminista, não são valorativos nem necessariamente perfeitamente exatos. Tentam ser a tradução semântica e política mais próxima (mas nunca perfeitamente fiel) dos termos com que os diferentes grupos ou tendências se reivindicam. Como estes termos provêm de diferentes contextos políticos e idiomas, e como são muitas vezes objetos de disputa política entre tendências às vezes bastante próximas, sua tradução não pode ser mais que uma aproximação.
[2]. Ao que parece, existem mais homens berdaches que mulheresberdaches, no caso das mulheres berdaches, que vivem como homens, parece que sua sociedade nunca deixa de considerá-las no fundo como mulheres, prova disso é que se dão casos de violação de mulheresberdaches por parte de homens (Mathieu, 1991).
[3]. O personagem do Poço da Solidão, Stephen, é tipicamente uma “invertida” tal como a descreve o sexólogo de então Havelock Ellis, que é amigo da autora e escreve o prefácio da novela. Se trata de uma historia na verdade, de solitária e dolorosa aceitação por parte da protagonista de uma “sorte” inamovível que pôs um espírito de homem em seu corpo de mulher. Na mesma época, Gertrude Stein escreve uma novela muito diferente, que explora as alegrias e ao mesmo tempo as complexidades das relações amorosas entre três jovens mulheres. Porém, tal novela não é publicada senão até finais do século. As lógicas da edição contribuiram para propagar por muitos anos uma imagem bastante negativa e tortuosa do lesbianismo, quando existiam desde já há muito tempo lésbicas que viviam sua sexualidade e sua vida afetiva fora das categorias da sexologia ou da psicanálise.

[4]. Colette Guillaumin, Nicole Claude Mathieu e Christine Delphy são as principais teóricas do feminismo materialista francês (outras vezes chamado “feminismo radical”). Em um de seus livros principais, Sexo, Raça e Prática do Poder, o ensaio “A idéia de Natureza”, Colette Guillaumin postula que as mulheres constituem uma “classe social de sexo” apropriada pela classe dos homens por meio da relação social de “sexaje“, seja individualmente (matrimônio heterossexual) ou coletivamente (por exemplo no caso das solteiras ou das freiras). O “sexaje” é a apropriação do corpo, dos produtos do corpo, do tempo e da energia psíquica da classe das mulheres por parte da classe dos homens. (Guillaumin, 1992, primeira publicação em 1978). Ela deriva a noção de sexaje da de “servaje (servitude)”, que era a condiçãi de quase escravidão das e dos servos da época feudal. Nicole Claude Mathieu, tanto desde a antropologia como desde a sociologia, contribuiu muito sobre as questões de consciência das dominadas e do “consentimento” à dominação, assim como à análise da articulação entre sexo, gênero e sexualidade (Mathieu, 1985, 1991). Christine Delphy por sua vez foi a primeira a analisar o trabalho doméstico gratuito das esposas como um elemento central do “modo de produção doméstico”, que também constitui às mulheres (esposas) em classe social (Delphy, 1970). As três se encontravam entre as fundadoras da revista francesa Questions Féministes nos anos 70, junto com Monique Wittig.
[5]. Da palavra serva/servo.
[6]. A revista AHLA, mencionou durante muitos anos em sua capa “Somente para lésbicas”, marcando assim seu caráter claramente separatista. Porém, se diferencia de outras formas de separatismo por sua inequívoca perspectiva materialista e busca de vínculos com outras lutas e temas. Neste sentido, publicou entre outros um dossiê sobre o dinheiro, outro contra a familia, e um excelente número sobre a opressão da gordura, entitulado “Gordura: obcessão? Não: opressão!” Em 2000, decidiu retirar de sua capa a menção “Somente para lésbicas”, em um afã de afirmar claramente sua vontade de vincular-se com outros grupos em luta.
[7]. Uso este termo “raça” por ser o que me parece menos inadequado. De nenhuma forma penso que existem “raças” no sentido racista da palavra, mas o termo “étnico” me parece refletir de maneira demasiado fraca a perspectiva de grupos e pessoas que colocam a existência do sistema racista como base da organização social, e sua destruição como um objetivo de luta impostergável.
[8]. Se poderia traduzir por “sapatão”. Grupos de dykes on bikes(sapatões motoqueiras) encabeçam às vezes as marchas do orgulho lésbico e gay.

[9]. O termo “socialista” alude aqui a lutas radicais e não social-demócratas. Por exemplo, a Coletiva do Rio Combahee escreve sua Declaração a pedido de contribuição feita ao grupo pela feminista socialista Zillah Eisenstein para sua antologia “Capitalist Patriarchy and the case for Socialist Feminism” (Eisenstein, 1979).

[10]. Para mais informação sobre grupos lésbicos centro-americanos, se podem consultar para Nicaragua, Bolt (1996), para Guatemala, ColetivoMujer-Es Somos e Rummel (1997), para El Salvador, Coletiva lésbica feminista salvadorenha de la Media Luna (1993 y 1994), e para México, entre outros textos, Hinojosa (s/f), um compêndio de artigos publicados pelos grupos Madres Lesbianas (Mães Lésbicas), Musas de metal eAmantes de la luna (2001) e uma tese recente de Alfarache Lorenzo(2000).
[11]. Para uma reflexão crítica sobre a noção de “preferência sexual“, ver Celia Kitzinger (Kitzinger, 1987).

[12]. “Transgênero” se refere principalmente a um questionamento às normas sociais de gênero (sobretudo a vestimenta e as atitudes corporais). “Transexual” tem a ver com uma transformação física (cirúrgica e hormonal). “Travesti” se associa mais com uma transformação momentânea (roupa e maquiagem), geralmente por parte de homens homossexuais. “Drag-kings”, são as mulheres ” reis” que se vestem quase caricaturescamente de homens, em simetria (sempre relativa) com as Drag-queens, homens “rainhas” homossexuais que retomam, levando ainda mais longe, o travestismo das “bichas”.
(Nota da Tradução: acho que a autora definiu mal Transgeneridade. Eu definiria mais bem como sendo a condição subjetiva de quem “atravessa o gênero”, quem se desloca da conformidade socialmente assignada de gênero ao sexo que lhe corresponderia. Pode ser traduzido em uma construção de imagem mas acho que mais que roupas, é a forma como uma pessoa se sente.

[13]. Butler questiona com razão a essencialização do gênero. Desafortunadamente, para tais fins, se apoia na “exótica” literatura francesa mais misógina que existe (psicanalítica e foucaultiana). Além disso, muitas feministas dentro e fora dos Estados Unidos já haviam chegado a este questionamento muitos anos antes com uma sustentação bastante mais sólida e materialista. Porém, frente ao crescente conservadorismo e despolitização do feminismo, especialmente dentro de alguns

departamentos de Gender Studies e “Estudos de Gênero”, seu trabalho vem a reforçar a corrente crítica que tanto necessitamos.

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Smith, Barbara. 1988. Yours in struggle: three feminist perspectives on anti- semitism and racism. Long Haul Press.

Smith, Barbara. 1998. The truth that never hurts : writings on race, gender and freedom. New Brunswick : Rutgers University Press.

Tamagne, Florence. 2000. Histoire de l’homosexualité en Europe. Berlin, Londres, Paris 1919-1939. Paris : Seuil.

Thadani, Giti. 1996. Sakhiyani. Lesbian desire in Ancient and Modern India. London : Cassell. 129 p.

Torton Beck, Evelyn (Editor). 1989. Nice Jewish girls: a lesbian anthology.

Paperback.

Turcotte, Louise. 1998. “L’itinéraire d’un courant politique : le lesbianisme radical au Québec”. Pp 369-398. In : Demczuk, Irène ; Remiggi, Frank W. Sortir de l’ombre. Histoire des communautés gaies et lesbiennes à Montréal de 1950 à 1970. Montréal : VLB.

Triton, Suzette. 2000. “De Radclyffe Hall aux butchs : réflexions sur les lesbiennes masculines”. Pp 143-168. In : Espace lesbien, n°1, octobre 2000. Actes du colloque national d’études lesbiennes, Toulouse, 13-14 mai 2000.

Toulouse : Bagdam Espace Editions. 190 p.

Vance, Carol. “Pleasure and danger : toward a politics of sexuality”. Pp 9-27. In: Vance, Carol (Ed). Pleasure and danger : exploring female sexuality. Boston: Routeldge & Kegan. (Traducción en español : 1989. “El placer y el peligro : hacia una política de la sexualidad”. Pp 9-50. In : Vance, Carol (Compiladora). Placer y peligro. Explorando la sexualidad femenina (selección de textos). Madrid : Editorial revolución, Hablan las mujeres.

Wieringa, Saskia, Blackwood, Evelyn (Editors). 1999. Same sex relations and female desires. Transgender practices across cultures. New York : Columbia University Press. 348 p .

Wittig, Monique. 2001. La pensée straight. Paris : Balland. 157 pp. (El libro recoje, entre otros, los dos artículos mencionados : “Straight mind “, Feminist Issue, n°1, 1980; primera publicación en francés en 1980 bajo el título: “La pensée straight”. Questions Féministes n°7, 1980, “Du mouvement de libération des femmes”, Tierce, y “On ne naît pas femme”, Questions Féministes n°8, 1980).

Este livro se terminou em setembro de 2004 e foi realizado pelas mulheres da oficina de fem-e-libros / creatividadfeminista.orghttp://www.creatividadfeminista.net

autoras@creatividadfeminista.org

tradução ao português por hembrista@riseup.net

1Eu não gostei de como ela colocou aqui, como se os movimentos lésbicos fossem devido a duas intelectuais! O lesbianismo separatista estadunidense e o lesbianismo radical francês assim como outros movimentos lésbicos foram devido a toda uma sorte de jornais, publicações, ensaios, manifestos e ações práticas de lésbicas das quais temos recordação por conta do que deixou escrito, publicado, fotografado. Uma boa referência disso é o site http://lesbianseparatist.tumblr.com/, que exibe grande arsenal de imagens e trechos de publicações, livros, ensaios, sobre o separatismo lésbico estadunidense e outros. Se duas autoras foram as mais traduzidas e difundidas não quer dizer que sejam elas as fontes dos movimentos lésbicos, que surgiram das ruas e de um esforço coletivo, sendo que boa parte dessas lésbicas permaneceu anônima, escrevendo e publicando sob nomes de coletivos e grupos. É de certa forma desmerecer essa história. Porém considero acertado colocar como exemplos, um ao lado de outro, Rich e Wittig como pensadoras paradigmáticas de ideologias que representaram as tendências principais no pensamento lésbico: o feminismo lésbico, por um lado, anglo-saxão, com Rich, que reforça o laço com feminismo e se reivindica na identidade ‘mulher’, e o lesbianismo radical, por outro, representado por Wittig que representou a separação do feminismo e da categoria política mulher, representado no uso independente da identidade lésbica. (N.T.).

2Numa tradução aproximada do termo “Straight” inglês, “O Pensamento Direito”, “Careta” ou “Estrito”, “Quadrado”. É uma gíria popular aplicada a pessoas de ‘orientação sexual’ heterossexual. Straight também se traduz por estrito, por rígido, certo, quadrado, e mesmo tendo sido publicado em francês, ela emprestou a expressão “Straight” do inglês para fazer essa referência. (N.T.)

3Novamente, não sei se é certo dizer que uma pessoa só “criou” o Separatismo lésbico nos Estados Unidos. Grupos separatistas feministas (heterossexuais) já haviam existido antes, que pregavam o celibato sexual como o Cell 16. Mas acho certo dizer que a autora em questão se usou da ideia de Nação Lésbica para dizer que lésbicas constituíam-se numa nação, que é da onde vem a ideia de separatismo. Porém pode apenas ter sido uma intelectual que sintetizou tendências já em andamento no movimento lésbico numa obra escrita. Para mim o que levou lésbicas a se separarem do feminismo era a lesbofobia do mesmo. (N.T.)

4Outra tradução possível também poder ser “bizarro”, “anormal”, “anômalo”, “diferente”. Queer é a forma de se referir genericamente às pessoas gays, lésbicas, travestis, trans, no inglês (N.T.).

5Teresa de Lauretis inventou o termo teoria queer, porém o abandonou e denunciou que o mesmo agora representa uma tendência neoliberal. (N.T.)

6Acho mesmo que usam boa parte de teorias lésbicas principalmente, de negras, mulheres de cor, tercermundistas, que foram citadas, para endossar o conceito da ‘interseccionalidade’, que não passa de um dos métodos camuflados de tentarem desmantelar o feminismo e colocar todas mulheres numa ‘guilt-trip‘ e ‘revisão de privilégios’ inúteis, em políticas de identidade e outras confusões. Usam a ideia das diferenças dentro do feminismo para desmantelar conceitos como os de sororidade e até mesmo a possibilidade das mulheres se articularem por meio da categoria política ‘mulher’ (N.T.)