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Lélia Gonzales

“Gostaríamos de chamar atenção para a maneira como a mulher negra é praticamente excluída dos textos e do discurso do movimento feminino em nosso país. A maioria dos textos, apesar de tratarem das relações de dominação sexual, social e econômica a que a mulher está submetida, assim como da situação das mulheres das camadas mais pobres etc., etc., não atentam para o fato da opressão racial. As categorias utilizadas são exatamente aquelas que neutralizam o problema da discriminação racial e, consequentemente, o do confinamento a que a comunidade negra está reduzida. A nosso ver, as representações sociais manipuladas pelo racismo cultural também são internalizadas por um setor que, também discriminado, não se apercebe que, no seu próprio discurso, estão presentes os mecanismos da ideologia do branqueamento e do mito da democracia racial. Em um encontro feminista realizado no Rio de Janeiro, nossa participação causou reações contraditórias. Até aquele momento, tínhamos observado uma sucessão de falas acentuadamente de esquerda, que colocavam uma série de exigências quanto à luta contra a exploração da mulher, do operariado etc., etc. A unanimidade das participantes quanto a essas denúncias era absoluta. Mas, no momento em que começamos a falar do racismo e suas práticas em termos de mulher negra, já não houve mais unanimidade. Nossa fala foi acusada de emocional por umas e até mesmo de revanchista por outras; todavia, as representantes de regiões mais pobre nos entenderam perfeitamente (eram mestiças em sua maioria). Toda a celeuma causada por nosso posicionamento significou, para nós, o atraso político (principalmente dos grupos que se consideravam mais progressistas) e do outro, a grande necessidade de denegar o racismo para ocultar uma outra questão: A EXPLORAÇÃO DA MULHER NEGRA PELA MULHER BRANCA.

 

Lélia Gonzales- Socióloga, intelectual, Política, Professora, Antropóloga e militante do Movimento Negro Unificado. (Em Memoria)