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Sobre a importância, para todas as mulheres, da experiência do amor lésbico

“Todas as relações heterosexuais são corrompidas pelo desequilíbrio de poder entre o homem e a mulher. Para manter a superioridade os machos precisam alimentar a ansiedade emocional e a submissão econômica da mulher. Para sobreviver numa ordem social de supremacia masculina, a mulher se enfraquece de modo a construir o ego masculino. A mulher não pode se desenvolver plenamente num contexto heterosexual devido ao efeito sufocante dessa cultura e aos papéis prejudiciais que ela é forçada a desempenhar. É mais provável que as relações entre mulheres estejam livres das forças destrutivas que tornam tais defesas necessárias. As normas institucionais e as limitações de uma cultura orientada para o poder, claro, também influenciaram as mulheres; entretanto, os níveis dominação-subordinação que as mulheres às vezes trazem para as relações lésbicas não podem obscurescer a igualdade essencial das pessoas envolvidas. Além disso, muitas das reações cultivadas nas mulheres são extremamente propícias a uma interação não-exploradora. Sensibilidade aos sentimentos e inclinações dos outros, cuidado, delicadeza, estão entre as qualidades que são mais cultivadas nas mulheres do que nos homens… [1] Como os homens ocupam uma posição social superior e são ensinados a disputar o poder de modo a manter essa posição, dificilmente aceitam os outros como iguais, especialmente as mulheres. Os contatos humanos têm de ser dispostos hierarquicamente, e as mulheres têm que estar no nível mais baixo.

Quando uma mulher recusa-se a aceitar essa posição precisa ser ‘posta em seu devido lugar’ e a tensão é inevitável. Contrariamente a isso, as mulheres estão aptas a começar numa base de igualdade e dedicar suas energias à criatividade e ao desenvolvimento em vez de lutar para manter a identidade contra a destrutividade do tradicional papel feminino.”
– Janis Kelly em Sisters in Love: An exploitation of the need for homossexual experience (Irmãs Apaixonadas: Uma exploração da necessidade da experiência homossexual) – retirado do capítulo sobre lesbianidade do Relatorio Hite sobre a Sexualidade Feminina.

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[1] Claro que a autora aqui se valeu de uma enorme romantização das relações lésbicas e uma crítica é necessário fazer. Sim, a socialização das mulheres é voltada para as ‘éticas do cuidado’. Porém ao reconhecer que isso seja pontos favoráveis para a escolha ativa por relações com outras mulheres e desprogramação da heterossexualidade compulsória, devemos criticar a tendência a uma essencialização do ser mulher e um culto dessa identidade das mulheres com a feminilidade, constructo patriarcal. Também preciso enfatizar que isso não é um consenso no feminismo lésbico, tendo sido criticada a idéia de lesbianidade como solução ou fetiche político e o apagamento da genuidade do desejo (embora a discussão sobre desejo e sua construção social também sejam assunto do feminismo radical, e como esse conceito é colocado em suspensão crítica).