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O mito da “mulher negra raivosa“ (Angry Black Woman ou Sapphire)

10-Jan-15

”Mulheres queridas! Vai aqui mais uma desconstrução de um estereótipo da mulher negra:O mito da “mulher negra raivosa“ (Angry Black Woman ou Sapphire)

 

Como nós sabemos a branquitude usa vários estereótipos para descrever pessoas negras. Os estereótipos da mulher negra mais conhecidos no Brasil é o da Mãe-Preta e o da Mulata Sensual, mas há muito outros. Um pouco discutido e sem tradução equivalente ainda, é o mito da „Angry Black Woman“ (que eu optei por traduzir como „mulher negra raivosa“). Eu traduzi a introdução de um artigo do professor de Sociologia da Ferris State University, David Pilgrim:„Safira é retratada nas caricaturas como uma pessoa rude, barulhenta, rancorosa, cabeça-dura e autoritária. Esse é o estereótipo da „mulher negra raivosa“ popularizada na cinema e na televisão. Ela é maledicente e emasculadora (emascular: tirar ou negar a masculinidade), leva uma mão na cintura e com a outra aponta o dedo, ou tem os dois braços na cintura, enquanto balança a cabeça freneticamente. Vive zombando do homem negro, começando pela sua condição de desempregado, até a acusações de viver correndo atrás de mulheres brancas.“Do livro da Professora da Universidade de Tulane, Melissa Harris-Perry “Sister Citizen – Shame, Stereotypes and Black Women in America, ” Esse estereótipo não reconhece a raiva da mulher negra como uma reação legítima diante de circunstâncias injustas, ele é visto como um desejo patológico, irracional da mulher negra em controlar o homem negro, a família e a comunidade. Ele pode ser empregado contra mulheres negras que se atrevem a questionar injustiças, mal-tratos ou pedir ajuda. Tanto os patrulhadores da branquitude, quanto patriarcas negros costumam ignorar esses apelos femininos, acompanhados de rolar de olhos, balançar de cabeças ou dizeres como: “ihhh, já começou, a rancorosa“. As preocupações das mulheres negras são ignoradas e suas vozes silenciadas em nome da manutenção de uma conversa racional e saudável. A raiva delas não é compreendida como uma realidade psicológica, mas é vista através das lentes de uma ideologia que distorce as experiências vividas por essas mulheres negras. O estereótipo da „mulher negra raivosa“ são um fardo para nossas irmãs, que tem a impressão de não poderem ser convincentes ou enfáticas, enquanto defendem seus interesses em público, pois suas emoções e engajamento são erroneamente compreendidas como irracionais.“ ”

Trecho de uma carta de Sheila Anne, lésbica separatista norte americana

10-Jan-15
“O separatismo lésbico é nosso desejo de amar a nós mesmas e a outras lésbicas enquanto lésbicas. É um impulso vital de sobrevivência. Ao enfocar no amor e o cuidado pela vida das lésbicas, nós criamos um mundo de criaturas amorosas, onde há espaço para um Eu e um Outro de mulher. Para criar este mundo, conscientemente escolhemos viver num processo de separação dos indivíduos, instituições e forças internalizadas que odeiam e destroem as mulheres/lésbicas e todas as outras formas de vida do planeta. Nós nos separamos desses indivíduos, instituições e forças internalizadas (as injúrias insidiosas que jogam umas contras as outras) de todas as formas possíveis. E constantemente nos desafiamos a expandir estas formas possíveis… Não há um único modo de ser uma lésbica separatista ou de viver o separatismo lésbico (…) De qualquer maneira, enquanto estamos nos separando do heteropatriarcado, com menor ou maior sucesso, em diferentes áreas de nossas vidas, o importante é lembrar que permaneceremos num processo contínuo de união com outras lésbicas, criando comunidades que atendem às nossas necessidades. É certo que, às vezes, o que buscamos é nebuloso. Nós caminhamos do que sabemos para o que desejamos, assim é mais fácil definir do que estamos nos separando para onde estamos indo (…) O separatismo cria a possibilidade e o espaço vital para pensarmos assim.(…) Lésbicas são seres muito poderosos que podem criar, neste mundo, o mundo que imaginamos”. (Boletim Um Outro Olhar, nº 16 outono de 1992, p. 25)

Resistência (Andrea Dworkin)

10-Jan-15
É um prazer imenso estar aqui hoje porque estava parecendo que o movimento das mulheres tinha se tornado uma agitação para proteger o sexo e que o nosso único propósito na terra era garantir que ninguém interferisse nas discussões sobre sexo, que ninguém falasse mal do sexo, que ninguém tivesse atitudes ruins em relação ao sexo, que nenhuma pensadora política desagradável começasse a nos fazer sentir desconfortáveis em relação ao sexo. E, é claro, na perspectiva mais material possível, isso tem significado defesas consistentes da indústria pornográfica. Onde não tem havido uma defesa política agressiva da indústria pornográfica, tem havido uma passividade, apatia e indiferença espantosas por parte das mulheres que são feministas do fundo do coração, mas que não saem às ruas para fazer algo pelas mulheres que estão sendo exploradas.

Estava realmente parecendo que os pornógrafos estavam ganhando. O que é tão excepcionalmente peculiar nisso tudo é que, pela primeira vez, eles pareciam assustados. Eles tem razão para se assustar, porque nós atingimos os negócios deles. Eles nunca acharam que nós poderíamos atingi-los. Eles são os imperadores do lucro e da dor. Nada poderia tocá-los.

No começo, quando o movimento das mulheres começou a falar sobre a indústria pornográfica, as pessoas diziam: “não vai dar em nada. Não tenham esperança. Vocês não podem se levantar contra eles. Não há nada que possamos fazer”. O poder deles parecia tão esmagador porque o dinheiro deles é esmagador. O fato de que eles detinham a mídia fazia deles um tipo de oponente formidável. Nós não detínhamos quase nada. O acesso deles à legitimidade – o monte de advogados que eles tinham para defender seus interesses; o que nós faríamos em face disso tudo?

Nós pegamos nossos cartazes esfarrapados e marchamos por quilômetros em círculos. Nós ficamos cansadas, nós nos sentimos derrotadas, nós pensamos: “não estamos chegando a lugar algum”. No país inteiro, em grandes e pequenas cidades, em todos os lugares, as mulheres estavam sendo ativistas contra a pornografia.

A mídia nunca noticiou. A maioria das pessoas não ligou para isso. Mas o feminismo estava vivo porque as mulheres estavam sendo ativistas contra a pornografia e a estavam usando para construir um novo e mais sofisticado entendimento da realidade do abuso sexual: o modo como todos os abusos sexuais se complementavam para machucar mulheres, para nos aniquilar, para nos tornar mercadorias.

Então, em Minneapolis, nós desenvolvemos uma lei de direitos civis e repentinamente os pornógrafos entenderam que estávamos tentando tirar o dinheiro deles. Aquelas pequenas e estranhas mulheres não estavam somente marchando em círculos e ficando tontas, mas também planejando entrar numa sala de tribunal e dizer: “nós vamos quebrar seus porquinhos, pegar toda sua grana e usá-la a favor das mulheres”.

A reação deles e a mobilização deles contra a portaria de direitos civis foram espetaculares. Não foram espetaculares porque eles acharam que a portaria iria funcionar, é claro. A raiva deles, a hostilidade, a frustração e a agressão foram porque finalmente eles tiveram que nos levar a sério como uma presença política que tem o poder de atingi-los.

E, horrivelmente, ao mesmo tempo o chão caiu para o movimento das mulheres. Todo mundo ficou com medo. Nós havíamos agido como se nós soubéssemos o que estávamos fazendo, como se nós soubéssemos o que eles estavam fazendo, como se nós pudéssemos saber o que eles fariam amanhã, do mesmo modo que descobrimos o que eles estavam fazendo ontem.

Mas a realidade é que destrui-los ficou fora de cogitação, porque destrui-los é uma coisa ruim, destrui-los é censura. E se o coitadinho do Bob Guccione não pode dizer o que ele quer dizer – mesmo que ele precise do corpo de uma mulher para fazê-lo – então o país ficaria mais pobre em ideias, mais pobre em liberdade política – NOSSA liberdade política, eles nos disseram. Nós temos que proteger esse cara para proteger nossa liberdade política. Nossos corpos são a linguagem na qual ele está se expressando e a nossa responsabilidade é garantir que ele continue fazendo isso.

O horror tem sido que mulheres acreditaram nisso, mulheres foram intimidadas e caladas em prol da defesa dessa Primeira Emenda que nem ao menos se refere a nós. Você deveria poder expressar a sua comunicação antes que ela fosse garantida pela Primeira Emenda e a verdade é que você não pode expressá-la se você é muito pobre, se você é muito louco – o que muitas mulheres são, depois de tudo o que passamos – ou se você foi silenciada através do abuso sexual, se esse abuso começou quando você era criança e agora você tem lutado, lutado e lutado pela sua identidade e pela sua integridade, porque alguém tentou destrui-las antes mesmo que estivessem formadas. Esse silêncio no qual vivemos é naturalizado. Nós somos levadas a acreditar que devemos aceitá-lo.

A realidade é que homens usam o sexo para expressar sua dominância em relação a nós. É um modo simples de dizer. O sexo é construído especificamente para ser um modelo de dominação masculina. É isso que o sexo significa nessa sociedade controlada por homens, na qual nós sofremos a desigualdade e somos sexualmente subordinadas.

Eu não acho surpreendente que, nesse sistema, as mulheres aprenderam a erotizar a falta de poder. É uma tragédia, mas não uma surpresa. O grande benefício para a dominação masculina quando as mulheres aprendem a ter prazer sexual na falta de poder é que isso facilita bastante a dominação. A força policial não é o que mantém nossa população subjugada.

Eu não entendo porque nós não achamos que nós temos o direito de existir, apenas de existir. Os pornógrafos se sentem seguros andando nas ruas. Eu não sei porque todas as lojas que vendem pornografia se sentem seguras à luz do dia e à noite, mas elas se sentem. Eles não estão preocupados com ninguém. Eles não estão preocupados conosco. O que nós vamos fazer com eles? Nós poderíamos fazer muita coisa, mas nós não fazemos nada!

Eu estou pedindo um ativismo consistente e militante contra as instituições e os sistemas de exploração que machucam as mulheres. Você deve considerar a pornografia como uma instituição primária na exploração das mulheres. No que quer que você foque seu coração e seu espírito para lutar pela nossa liberdade, você tem que contar para alguém ou mostrar para alguém. Não pode simplesmente ficar tudo no seu coração. Você tem que estar disposta a ser um pouco heróica, a estar preparada para levar os golpes, para levar a punição – você vai ser punida por ser uma mulher, de uma maneira ou de outra. Você vai se machucar de qualquer jeito.

A diferença é que quando você começa a estar politicamente ativa, como eu tenho certeza que muitas de vocês sabem, eles aprendem o seu nome. Eles dizem: “ah, é essa! peguem ela”. Eles escrevem o seu nome, eles entendem, eles tem uma lista de prioridades. Se eles souberem seu nome, você estará no topo da lista, e não simplesmente no final. Então você se arrisca, você vai com tudo.

Eu estou pedindo para que vocês não nos deixem perder o que conseguimos depois de quinze anos de esforços no entendimento do abuso sexual, no entendimento de como a violação sexual se torna normativa nessa sociedade. Não nos deixem perder cada esforço que já fizemos para lutar contra aqueles que estão nos machucando de propósito. Não existe ambiguidade nisso, eles mesmos o admitem. Eles só não querem que você ligue para isso, faça algo sobre isso ou ache que pode fazer algo sobre isso.

Nós tivemos ganhos enormes. Se não houver um movimento de mulheres – um movimento real, político, uma resistência organizada, ativa e militante – nós não teremos mais ganhos. Eu peço que você ache uma forma de revigorar o seu ativismo contra o ódio às mulheres, contra a violação sexual de mulheres. Eu peço que você não seja parte de um movimento que age como um escudo de proteção ao sexo ou a quaisquer práticas sexuais que específica e claramente machucam mulheres.

Texto original presente na coletânea The Sexual Liberals and The Attack on Feminism

 

instituição do coito compulsorio e a acusação de puritanismo por parte de liberais sexuais que são a versão atualizada dessa instituição

10-Jan-15

Os homens atacam feministas há décadas com a idéia de puritanismo, desde a revolução sexual que foi o inicio do backlash contra os direitos das mulheres, com essa história de que somos puritanas. A instituiçao da sexualidade é uma forma de regularizar o acesso masculino aos corpos das mulheres, logo eles tentaram fazer essa confusão entre feminismo e erotização da heterossexualidade que começou com a sexologia no começo do século 20, com psincalise, etc, na verdade começou na Grecia mesmo quando se considerava a ‘histeria’ a perturbação do útero, a ser curada com sêmem masculino, o pênis e o coito é usado há séculos como forma de adestramento das mulheres, o discurso do orgasmo na relação sexual foi um backlash contra a liberdade das mulheres que começou a ser criado e propagandeado como ‘saúde’ para manter as mulheres nos casamentos e relacionamentos heterossexuais quando passaram a se libertar e trabalhar, ser autonomas, surgiu paralelamente o discurso da ‘lésbica’, qualquer mulher que não estivesse em relação com um homem passou de ‘celibataria’ a ser considerada ‘lésbica’, aí surge o discurso do puritanismo sexual, da frigidez… foi uma forma de controle social sobre mulhers por parte de um poder médico supremacista masculino, se mulher não goza com degradação masculina ela é frigida, a frigidez , a histeria, sempre foi um ato de desobediencia civil das mulheres, de resistencia a opressão, de não colaboração mesmo que inconsciente.Quando chamam uma mulher de puritana é porque nossa resistencia a heterossexualidade compulsória é punida e ridicularizada. E a gente precisa como tarefa feminista partir de nossos proprios valores mulher-identificados, e deixar de adotar o potno de vista dos agressores que nos colonizou. Logo, não devemos recuar quando nos acusam de moralistas ao problematizar a sexualidade construída sob condições patriarcais.

gênero – deep green resistance

10-Jan-15
“Feministas radicais criticam o próprio gênero. Nós não somos reformistas – somos abolicionistas do gênero. Sem os papéis de gênero socialmente construídos que constituem a base do patriarcado, todas as pessoas seriam livres para se vestir, se comportar e amar os outros da maneira que quisessem, não importando o tipo de corpo que têm.

O patriarcado é um sistema de castas que transforma os seres humanos que nascem biologicamente macho ou fêmea em classes sociais chamadas de homens e mulheres. Pessoas do sexo masculino são transformadas em homens por meio da socialização voltada à masculinidade, que é definida por uma psicologia baseada na insensibilidade emocional e em uma dicotomia entre o eu e o outro. Esta é também a psicologia exigida aos soldados, e é por isso que não acho que você possa ser um ativista da paz sem ser feminista.

No patriarcado, a socialização feminina é um processo com o objetivo de constranger psicologicamente e diminuir as meninas – também conhecido como “aliciamento” – para criar uma classe de vítimas conformadas. A feminilidade é um conjunto de comportamentos que são, em essência, a submissão ritualizada.

Não vemos nada para comemorar ou abraçar na criação do gênero. O patriarcado é um arranjo de poder corrupto e brutal e queremos desfazê-lo para que a categoria de gênero não exista mais. Esta é também a nossa posição sobre raça e classe. As categorias não são naturais: elas só existem porque os sistemas hierárquicos de poder as cria (veja, por exemplo, o livro de Audrey Smedley Race in North America). Queremos um mundo de justiça e de igualdade, onde as condições materiais que atualmente criam raça, classe e gênero sejam para sempre superadas.

O patriarcado facilita a exploração de corpos femininos para o benefício dos homens – para a gratificação sexual do sexo masculino, por mão de obra barata e para reprodução. Para dar apenas um exemplo, há aldeias inteiras na Índia, onde todas as mulheres têm apenas um rim. Por quê? Porque seus maridos têm vendido o outro. Gênero não é um sentimento – é uma violação dos direitos humanos contra toda uma classe de pessoas, “pessoas chamadas mulheres.”

Nós não somos “transfóbicas.” Temos, no entanto, um desacordo sobre o que é o gênero. Generistas acreditam que o gênero é natural, um produto da biologia. As feministas radicais acreditam que o gênero é social, um produto da supremacia masculina. Generistas acreditam que o gênero é uma identidade, um conjunto interno de sentimentos que as pessoas podem ter. As feministas radicais acreditam que gênero é um sistema de castas, um conjunto de condições materiais em que se nasce. Generistas acreditam que o gênero é um binário. As feministas radicais acreditam que gênero é uma hierarquia, com os homens na parte superior. Alguns generistas afirmam que o gênero é “fluido”. Feministas radicais apontam que não há nada de fluido em seu marido vender seu rim. Então, sim, nós temos algumas grandes divergências.”

 

Deep Green Resistance

tradução por C.P.

A erotização da subordinação das mulheres (Sheila Jeffreys)

10-Jan-15
Eu gostaria de falar sobre a construção da sexualidade feminina em volta da nossa subordinação e o que podemos fazer sobre isso, se é que podemos, enquanto mulheres lésbicas e heterossexuais.

 Isso se tornou um assunto crucial por conta do backlash desenvolvido por mulheres auto-denominadas feministas contra as que, de nós, lutam contra a pornografia. No começo, quando primeiramente estávamos afrontando a pornografia e a violência sexual masculina, parecia que era uma luta que iria para frente.

 Na verdade, nós nunca tivemos plena certeza de que iria para frente, já que nós que estávamos envolvidas no movimento feminista britânico contra a pornografia frequentemente sentávamos em grupo e admitíamos – embora não tão rapidamente, porque era difícil – que até mesmo os contéudos pornográficos mais misóginos com os quais estávamos lidando eventualmente nos causavam tesão. As feministas que, enquanto indivíduos, tinham essa reação à pornografia contra a qual queríamos lutar, se sentiam culpadas e isoladas. Nós nos sentíamos assim especialmente quando outras mulheres do grupo diziam que elas não conseguiam imaginar como é que alguém poderia sentir tesão com aqueles conteúdos.

Depois que esse problema continuou existindo por alguns anos e nós não havíamos avançado no entendimento das reações sexuais à pornografia, um backlash se desenvolveu contra nós. Esse backlash veio de mulheres que se descreviam como feministas e que queriam criar uma nova erótica, uma erótica feminista. Não surpreendentemente, a erótica feminista se parecia muito com a velha pornografia anti-feminista: ela erotizava a dominação e a subordinação.

Algumas dessas mulheres envolvidas em rechaçar as ativistas feministas anti-pornografia, algumas dessas mulheres envolvidas na criação da – supostamente nova – erótica da dominação-e-subordinação eram feministas que antes estavam, elas mesmas, envolvidas na luta contra a pornografia e a violência sexual masculina.

O que eu acho que aconteceu foi que, assim que feministas começaram a exibir slides analisando a pornografia e assim que mulheres começaram a ter reações àqueles slides, às vezes sentindo tesão por eles, nós então tinhámos duas opções a escolher. Nós poderíamos dizer: “eu sinto tesão com esses slides. Não é absolutamente aterrorizante o modo como a minha subordinação, enquanto mulher, foi erotizada e conseguiu entrar no que é mais pessoal e íntimo – meu coração e meu corpo – e agora parece ser parte do que é a minha intimidade, do que é meu?”

Nós poderíamos dizer isso e ficar absolutamente furiosas por conta do fato de que a opressão das mulheres realmente entra a fundo nos nossos corações e nas nossas mentes. Essa é a opção que eu e outras feministas escolhemos. E portanto isso nos motiva ainda mais a lutar contra a pornografia e a violência masculina.

Alternativamente, as mulheres que sentiam tesão com aqueles slides poderiam pensar: ”eu me sinto atraída por esse material. Portanto, eu detesto que as feministas estejam mostrando isso a mim. Eu estou brava porque elas estão me fazendo sentir culpada e envergonhada. Então, eu vou me opor a elas”. Acho que é por isso que algumas feministas estão se opondo às ativistas anti-pornografia.

O que eu estou querendo dizer é que todas nós temos o mesmo problema: nossa subordinação foi erotizada. Mas há duas maneiras de lidar com isso: pelo viés feminista ou se opondo a ele.

Então, assim me parece, que a coisa mais importante que precisamos fazer para seguir em frente é falarmos, juntas e de modo a gerar consciência, sobre a construção da nossa sexualidade. Nós temos que falar sobre aquelas coisas tão difíceis de serem ditas, como por exemplo as fantasias que nós temos dentro das nossas mentes, o modo como sentimos tesão e tudo o que isso significa. Então nós poderemos começar a discutir sobre a diferença entre sentimentos sexuais positivos e sentimentos sexuais negativos, nós poderemos decidir onde é que colocaremos a linha divisória. Eu acho que existe, sim, uma linha a ser estabelecida, porém ainda há dúvidas sobre onde colocá-la.

Quando nós fizermos isso, quando nós pudermos falar juntas sobre essas coisas, nós teremos a oportunidade de entender até que ponto nós internalizamos a nossa opressão e como isso tem nos afetado. Só então estaremos aptas a nos organizar de novo, a nos reconectar, unificar e direcionar nossa raiva à pornografia e à violência sexual masculina.

Vocês provavelmente sabem que algumas libertárias que tem erotizado a dominação e a subordinação tem promovido, também, práticas entre lésbicas como butch e femme role-playing e sadomasoquismo. Butch e femme tem começado a minar qualquer possibilidade de análise da sexualidade lésbica agora, e eu acho isso bem alarmante. (Para uma discussão sobre as implicações da reinvenção do role-playing para lésbicas, veja Sheila Jeffreys, 1987.) Um exemplo da glamourização do role-playing é um artigo chamado “Com o Que Estamos Rolando na Cama” de Cherrie Moraga e Amber Hollibaugh (Amber Hollibaugh e Cherrie Moraga, 1984). Nesse artigo, Amber se identifica como femme e diz que você não pode machucar a identidade sexual de uma butch porque essa identidade é muito frágil. Onde nós ouvimos isso antes? Nas palavras da Amber, ela simplesmente sentaria no colo de uma butch, ao invés de fazer uma aproximação mais óbvia.

A co-autora, Cherrie Moraga, identificada com a butch nesse artigo, fala como ela, sendo butch, não simplesmente senta no colo de alguém, mas sim vai até a garganta. A parte encenada por uma femme aqui é terrivelmente similar ao papel da fêmea heterossexual no clássico anti-feminista da Marabel Morgan, “A Mulher Total” (Marabel Morgan, 1975).

Um problema em levantar essas questões é que pode parecer como se somente lésbicas erotizassem a dominação e a subordinação, ou como se a maioria que erotizasse fosse lésbica. Isso, é claro, está longe de ser verdade. Entretanto, é necessário que lésbicas afrontem o role-playing para que possamos construir uma sexualidade igualitária. Quando eu me descobri lésbica, pela primeira vez eu não estava fingindo um papel ou imaginando que a pessoa com a qual eu estava seria alguém com incríveis poderes que na verdade ela não tinha. Pela primeira vez, eu pude ter uma experiência sexual igualitária.

Eu acredito que é possível para mulheres transformar sua sexualidade e se aproximar de modos mais igualitários de se relacionar sexualmente. Mas eu também acho que essa transformação possa ser mais difícil para mulheres heterossexuais do que para lésbicas.

Role-playing é algo próprio da heterossexualidade, é claro, mas mulheres com consciência feminista frequentemente veem a si mesmas como exceções. Se você olhar para qualquer casal heterossexual pró-feminista, você verá que a disparidade no modo como eles se sentam, se movem e se vestem é extrema. A erotização da desigualdade não está necessariamente atrelada ao lesbianismo, já que a desigualdade de sexo não é a base da relação sexual. É difícil imaginar como o desejo sexual hétero – considerando o role-playing presente em praticamente toda relação – poderia ser possivelmente igualitário.

Então eu acho que, enquanto mulheres heterossexuais e lésbicas, nós todas temos um problema a confrontar e resolver. Eu acho que nós devemos fazer algo a respeito da erotização da nossa subordinação. Ela é prejudicial a nós pessoalmente e as nossas relações. É, também, prejudicial a nós politicamente, porque dificulta nossa luta contra a supremacia masculina. Somente através do ataque à construção da nossa sexualidade é que podemos ir para a frente e realmente impactar a sociedade hetero-patriarcal na qual vivemos. Talvez devamos começar um diálogo, enquanto mulheres lésbicas e heterossexuais, sobre como podemos alcançar uma sexualidade igualitária.

Texto original presente na coletânea The Sexual Liberals and The Attack on Feminism

tradução: FAQ (Perguntas Frequentes) sobre Pornografia/Antipornografia

10-Jan-15
O que há de errado com a pornografia?

1) Pornografia degrada e desumaniza as mulheres e as meninas

2) A pornografia glamouriza o estupro

3) A pornografia prejudica relacionamentos afetivos e sexuais

4) A pornografia mente sobre as mulheres, mostrando-as como sexualmente insaciáveis

5) A pornografia cria insegurança nos homens por mostrar que o prazer sexual está essencialmente ligado ao tamanho do pênis

6) A pornografia glamouriza a escravidão sexual

7) A pornografia encoraja a hiper sexualização de crianças

8) A pornografia é racista

*Por que você está argumentando contra a pornografia?

Porque a pornografia degrada as mulheres, as relações sexuais e toda a humanidade. Ela frequentemente glorifica e promove o sadismo, o masoquismo, estupro, incesto, pedofilia, misoginia e a violência contra as mulheres e meninas. Prejudica relacionamentos, casamentos, crianças e famílias. Ela também cria demanda por prostituição e tráfico sexual internacional. Além disso, é uma indústria sem regulamentação e abusiva que freqüentemente explora sobreviventes vulneráveis de abuso sexual na infância. Permitir que todos esses danos sejam causados não é uma opção consciente.
*Mas se alguém quiser fazer pornografia é sua escolha pessoal e, portanto, não é da conta de ninguém. 

Só porque alguém faz uma escolha não significa que seja uma escolha saudável ou boa para a pessoa ou para a sociedade em geral. As pessoas freqüentemente escolhem usar drogas perigosas ou cometer violências contra os outros. Isso não significa que essas escolhas são positivas ou éticas. Se você se preocupa com a humanidade é importante se manifestar a fim de encorajar as pessoas a fazer escolhas mais saudáveis que irão melhorar as suas vidas e as condições gerais da nossa sociedade.
*Se você não gosta de pornografia então simplesmente não assista.

– Permanecer em silêncio diante de extremo sexismo, abuso e desumanização seria irresponsável  e isso não é uma opção para qualquer pessoa com consciência. Quer sugerir o mesmo sobre outros problemas? Quer dizer para alguém que se eles não gostam de racismo ou de violência para simplesmente olhar para o outro lado?

*Você não deve forçar suas opiniões sobre os outros. Isso é fascismo! 

– Ninguém está sendo “forçado” a ler nada e não é “fascista” fornecer informação educativa para que os indivíduos possam fazer escolhas informadas sobre o seu consumo de pornografia ou a sua participação na indústria do sexo.

*Você está sendo tendenciosa. Para ser justa, você deve apresentar ambos os lados da ”moeda”. 

– Ser tendenciosa contra uma indústria exploradora e sexista é algo para se orgulhar, e não há necessidade de apresentar o outro lado. No entanto, é fácil encontrar os pontos de vista de pessoas que são a favor da pornografia e prostituição, etc, como a Internet está saturada com pornografia e sites que vigorosamente promovem, defendem e apoiam todos os aspectos da indústria global multi-bilionária do sexo.

*Se você é anti-pornografia, então isso significa que você é anti-sexo, não é? 

– Olha, rejeitar a crueldade e a misoginia da pornografia não significa ser contra o sexo! O sexo pornográfico é sobre o desligamento de sentimentos  e  sobre objetificação, humilhação e degradação das mulheres. O sexo pode ser muito melhor do que esta definição estreita da sexualidade como “dominação / subordinação”. O sexo pode ser sobre a humanidade, respeito, carinho e amor. Como a educadora feminista anti-pornografia Gail Dines diria: “Quando criticamos o McDonalds por sua comida pouco saudável, práticas de negócios ambientalmente destrutivas e direcionamento das crianças através da publicidade manipuladora, ninguém nos acusa de sermos anti-comida”. O mesmo se aplica à pornografia. Se a pornografia tem diminuído a sua definição de sexualidade, sinto pena de você.
* Olha, a pornografia existe desde os homens das cavernas, quando os primeiros seres humanos desenharam atividades sexuais nas paredes das cavernas … Então, por que fazer grande alarde sobre isso? 

É verdade que sempre houveram diferentes tipos de representações sexuais ao longo da história, mas dizer que eles foram todos pornografia é simplista. É verdade que a pornografia pode ser rastreada sem dificuldade, tanto quanto na Grécia Antiga, no oeste, mas a palavra “pornografia” também se refere à escrita, gravura ou desenho de mulheres que, de fato, foram mantidos em escravidão sexual feminina na Grécia Antiga (C. MacKinnon e A. Dworkin, em D. Russell Ed, Fazendo da Violência sexy; 1993). “A influência da pornografia em homens que governam as sociedades, e, assim, para o desenvolvimento das instituições sociais misóginas, pode ser rastreada através do feudalismo, mas é apenas por meio da tecnologia relativamente recente que o ambiente social foi saturado com a pornografia que fere mulheres com legitimidade social. Esta mesma abrangência e disponibilidade aberta tornaram também possível entender e documentar os efeitos da pornografia, daí o seu lugar na institucionalização da cidadania de segunda classe para as mulheres, pela primeira vez na história.”(Nota do projeto de lei proposto sobre a pornografia, 26 de dezembro de 1983). Houveram muitas representações sexuais na arte e literatura na história, mas nem todas elas foram pornografia. Além disso, a indústria da pornografia contemporânea não é uma forma de arte, mas de exploração. Em uma sociedade capitalista patriarcal a indústria da pornografia tem apenas interesse em obter lucro com imagens que exploram a sexualidade, em vez de desvendá-la.

*A pornografia não nos torna mais sexualmente criativos? 

Uma das reivindicações mais absurdas feitas por pornógrafos e seus defensores é que “a pornografia expande nossa imaginação”. Na verdade, a fórmula imutável do script pornográfico desliga em vez de abrir a imaginação sexual das pessoas. Pornografia só dá às pessoas uma visão da sexualidade que está enraizada na dominação das mulheres e aceitação das mulheres de sua própria degradação pelos homens. Ela oferece a mesma progressão de atos sexuais que terminam da mesma forma com o que é  chamado (na indústria), o “cum shot” ou “Money Shot”. Se você acha isso criativo, sinto pena de você.
*Você é pró-censura? 

Não, eu não sou a favor da censura. Gritar “censura” sempre foi uma tática de pornógrafos e seus defensores de calar a crítica feminista da pornografia e afastar as pessoas da questão. Além disso, quando as feministas escrevem artigos sobre os malefícios da pornografia, a maior parte da grande imprensa se recusa a publicá-las. Então, quem está sendo censurado aqui?Somos a favor de educar sobre os danos da pornografia, a fim de reduzir o consumo da mesma. Existem muitas outras maneiras de abordar esta questão, além de censura, como a educação das comunidades sobre os efeitos prejudiciais de pornografia, exigindo fóruns públicos ou discussões onde pudéssemos falar sobre os danos da pornografia, defendendo uma abordagem de direitos civis para esses danos, ou a exibição de rótulos de advertência (como nos maços de cigarros), etc … Estas são algumas das muitas estratégias que não necessitam de censura. Nós não queremos censura, nós nos opomos à CENSURA !!!
*Não há também feministas por aí que dizem que são pró-pornô? 

Colocar mulheres contra mulheres e feministas contra feministas tem por muito tempo sido um dos planos sórdidos favoritos dos pornógrafos. As feministas anti-pornografia estavam aqui antes das “feministas” pró-pornografia. Você não pode ser uma feminista pró-porn assim como não pode ser um vegan pro-carne! Feminismo não é sobre a promoção da disponibilidade de corpos de mulheres para o uso dos homens. O feminismo é a noção radical que as mulheres são seres humanos, tanto quanto os homens. Será que a pornografia retrata as mulheres como sendo seres humanos significativos reais com esperanças e sonhos? Não, a pornografia odeia e desumaniza as mulheres! As ditas ”feministas” como Nina Hartley, Susie Bright, Nadine Strossen, Wendy McElroy, Carol Queen ou qualquer outra das “feministas” que são pró-pornografia, pregam algo danoso para as mulheres. Essas mulheres provavelmente estão fazendo um monte de dinheiro defendendo a indústria pornô! Algumas delas também defendem a prostituição como um trabalho viável para as mulheres (cf. COYOTE). Estas “feministas” se chamam “radicalistas sexuais” ou “sexo-positivas” . Como Christine Stark diz: “radicalismo sexual de  verdadeiro seria reconhecer as estruturas de desigualdade e opressão, trabalhando em direção a relações igualitárias, e a se aliar com aqueles (sejam eles minorias ou maiorias) que não têm poder político ou social” (como as vítimas da pornografia e prostituição) … “Muitas das” radicais do sexo “são brancas acadêmicas privilegiadas que fizeram suas carreiras defendendo a exploração de mulheres, regurgitando mentiras que culpabilizam as mulheres.”(Not for Sale, 2004). Outras mulheres que defendem a pornografia se tornaram pornógrafas (embora a esmagadora maioria dos pornógrafos ainda são homens) e estão prejudicando muitas mulheres fazendo isso. Quando algumas mulheres defendem a pornografia e a prostituição, significa nada mais do que uma adesão ao opressor… feministas são mais fortes do que isso: elas se rebelam contra o opressor! As “feministas” pro-pornografia também são muitas vezes divulgadas pela mídia e infinitamente apoiadas por pornógrafos e defensores da indústria.
*Não existe uma maneira de fazer algum pornô que não agrida a mulher? Na verdade, eu ouvi dizer que alguns pornôs feministas existem, não é verdade? 

É compreensível que em uma sociedade com uma cultura midiática que celebra a pornografia não haveria interesse em contrariar as imagens misóginas e racistas com representações mais saudáveis da sexualidade. E tal idéia parece ser compreensível quando tantas pessoas foram socialmente treinadas para consumir imagens para a sua própria sexualidade (em vez de ter uma sexualidade própria que não depende de imagens). Mas você tem que considerar estes fatos: – Número 1: A coisa mais importante no momento é se comunicar com os outros, a fim de ir contra a cultura da pornografia e mudá-la. Temos de falar honestamente sobre a crise de sexo/gênero que enfrentamos, juntamente com a epidemia de violência contra mulheres e crianças. Temos de dizer NÃO à pornografia! – Número 2: a palavra “pornografia” (derivado das palavras gregas “Porne” e “graphos”) significa originalmente a “representação das prostitutas em situação mais precarizada”.  Será sempre misógino e sempre será a representação das mulheres como “as prostitutas em situação mais precarizada”. Quanto ao chamado pornô feminista, ele não muda nada na dinâmica de dominação-subordinação da pornografia almejada  por homens heterossexuais. Considere um título, por exemplo: “O Poder da Submissão”, de Nina Hartley. “Pornô feminista”, “pornô para as mulheres”, ou “pornô para casais” são apenas tentativas baratas de pornografia de marketing da pornografia para mulheres para ganhar mais dinheiro. Não há dúvida de que há um lugar para pensamentos criativos de uma sexualidade saudável na luta pela cultura de justiça e de igualdade entre os sexos. Mas, uma representação saudável da sexualidade não deve ser chamada de “pornografia”; TALVEZ em uma sociedade não-patriarcal, ela seria chamada de “erotico”. No entanto, em uma sociedade patriarcal e capitalista, a máxima “se você não pode vencê-los, junte-se a eles”, a idéia de querer “erotica feminista” como uma solução para o problema, é uma pura perda de tempo. Pornografia misógina (que é o tipo de material sexual que a maioria dos homens querem ver) não vai sumir tão facilmente e as mulheres e as crianças continuarão a ser prejudicadas. Há tantas coisas mais urgentes e tantas outras lutas a serem superadas antes de sermos capazes de viver em uma sociedade não-patriarcal do que pensar em coisas como  “formas igualitárias de artes eróticas” !!! De fato, pensar sobre essas coisas antes da derrubada de todo o patriarcado acontecer, não é nada mais do que se entregar! E isso é uma loucura! Enfrentar os malefícios da pornografia e prostituição de mulheres e crianças, e trabalhar para a construção de um novo mundo não-patriarcal, são causas primordiais !!! Como Gail Dines sublinhou na conferência anti-pornografia feminista de 2007, vivemos em uma “cultura da imagem como base” (ou seja, qualquer coisa, para ser útil, tem que ser feita em uma imagem) e a resposta para parar cultura pornô não é mais imagens. Pessoalmente, eu me sinto muito mais livre sem ter imagens manipulando e controlando minha vida e sexualidade!

* Por que você está dizendo que a pornografia é racista? 

A desigualdade  racial ainda é tão obviamente presente na sociedade, se você olhar com atenção verá que a pornografia é extremamente racista. Na pornografia, as negras e negros, latinas e latinos, indígenas etc são retratados como sub-humanos e possuídores de uma sexualidade animalesca, enquanto as mulheres asiáticas são retratadas como extremamente submissas. Mulheres latinas são retratadas como sendo “de sangue quente”. As feministas estão plenamente conscientes desses estereótipos racistas presentes na pornografia “interracial”. As mulheres não brancas são maioritariamente observadas em um  material pornô mais agressivo. Isso mostra uma ideologia racista! Obviamente, o racismo – assim como a violência – na pornografia é feita de forma ”invisível” porque foi hiper sexualizado…
*E a pornografia gay e lésbica? Você é contra essas categorias também?

Somos contra todas as formas de pornografia, porque, infelizmente, a grande maioria da pornografia comercial gay masculina imita a dinâmica de dominação / subordinação do pornô hétero. O mesmo acontece com a maior parte da pornografia lésbica. Essas categorias também são prejudiciais. Somos pró-homossexuais e pró-lésbicas . Além disso, a homofobia é por vezes expressa através de diálogos na pornografia heterossexual.

*Olha, existe realmente uma ligação cientificamente comprovada entre pornografia e estupro? 

Ao contrário do que os seus adversários dizem, as feministas nunca fizeram a afirmação de que houve uma “prova científica” de que a pornografia causa estupro. O comportamento humano é complexo demais para fazer tais afirmações simplistas. Mesmo Diana EH Russell, em seu escrito “A pornografia como causa do estupro”, concorda que a pornografia sozinha não causa o estupro; ela explica o papel da pornografia em estupro só em um caso de “causalidade múltipla”. A pergunta que devemos fazer não é “a pornografia causa estupro?” mas sim ” a pornografia é sempre um fator implicador de estupro?”. Sorte que nem todos os usuários de pornografia estupram mulheres. No entanto, os estudos das ciências sociais empíricas que têm sido analisados juntamente com os testemunhos de mulheres, crianças, trabalhadores de abrigos para mulheres maltratadas e pessoas que trabalham com criminosos sexuais nos levam a crer que realmente existe uma ligação entre pornografia e violência sexual.

Essas perguntas e respostas foram tiradas dos sites againstpornography.org

tradução: g.a.

Porque pornografia importa para feministas – Andrea Dworkin

10-Jan-15
Pornografia é uma questão essencial porque a pornografia diz que as mulheres querem ser agredidas, forçadas e abusadas; pornografia diz que as mulheres querem ser estupradas, espancadas, sequestradas, desfiguradas; pornografia diz que as mulheres querem ser humilhadas, envergonhadas, difamadas; pornografia diz que a mulher diz Não mas quer dizer Sim – Sim para a violência, Sim para a dor.

Também: pornografia diz que as mulheres são coisas; pornografia diz que ser usadas como coisas preenche a natureza erótica das mulheres; pornografia diz que mulheres são coisas que homens usam.

Também: pornografia diz que mulheres são putas, vaginas, pornografia diz que os pornógrafos definem as mulheres; pornografia diz que homens definem as mulheres; pornografia diz que mulheres são o que os homens querem que as mulheres sejam.

Também: pornografia mostra as mulheres como partes de corpo, como genitais, fendas vaginais, mamilos, nádegas, lábios, feridas abertas, pedaços.

Também: pornografia usa mulheres reais.

Também: pornografia é uma indústria que compra e vende mulheres.

Também: a pornografia estabelece o estandarte para a sexualidade feminina, para os valores sexuais femininos, para o crescimento das meninas, para o crescimento dos meninos, estimulado pela propaganda, filmes, vídeos, artes visuais, arte fina e literatura, música com palavras.

Também: a aceitação da pornografia significa o declínio das éticas feministas e o abandono das políticas feministas; a aceitação da pornografia significa que as feministas abandonaram as mulheres.

Também: pornografia reforça os direitos dos homens sobre as mulheres por fazer o ambiente externo fora da casa mais perigoso, ameaçador, pornografia reforça o direito do marido sobre a mulher por fazer o ambiente doméstico mais perigoso, mais arriscado.

Também: pornografia torna a mulher em objetos e conveniências; pornografia perpetua o status de objeto das mulheres; pornografia perpetua as divisões de auto-derrota entre as mulheres por perpetuar o status objetal da mulher; pornografia perpetua abaixa auto-estima da mulher por perpetuar o status de objeto da mulher; pornografia perpetua a descrença da mulher pela mulher por perpetuar o status de objeto da mulher; pornografia perpetua a dessignificação e degradação da inteligência e criatividade da mulher por perpetuar o status de objeto da mulher.

Também: violência contra a mulher é usada na pornografia e pornografia encoraja e promove violência contra as mulheres como uma classe; Pornografia desumaniza a mulher usada na pornografia e pornografia contribui para e promove a desumanização de todas as mulheres; pornografia explora a mulher usada na pornografia e acelera e promove a exploração sexual e econômica da mulher como uma classe.

Também: pornografia é feita por homens que sancionam, usam, celebram e promovem violência contra mulher.

Também: pornografia explora crianças de ambos os sexos, especialmente garotas, e encoraja violência contra crianças, e faz violência às crianças.

Também: pornografia usa racismo e anti-semitismo para promover provocação sexual; pornografia promove hostilidade racial por promover a degradação racial como ´sexy´, pornografia romantiza os campos de concentração e de plantação, os nazistas e os proprietários de escravos ;pornografia explora os estereótipos de comportamentos raciais para promover excitação sexual; pornografia celebra obsessões sexuais racistas.

Também: pornografia nubla a consciência, a faz mais brutalizada para a crueldade, para a inflição de dor, para violência contra pessoas, para a humilhação e degradação de pessoas, para as mulheres e crianças abusadas.

Também: a pornografia nos deixa sem futuro; pornografia nos priva de esperança de dignidade; pornografia desenvolve a diminuição do nosso valor humano numa sociedade e nossos potenciais humanos de fato; pornografia esquece a auto-determinação sexual das mulheres e das crianças, pornografia nos usa e nos descarta fora; pornografia aniquila nossa chance de liberdade.

Tradução Veggie Grrrl 

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“Uma declaração Negra Feminista” – Combahee River Colective (A Coletiva do Rio Combahee) – Abril de 1977

10-Jan-15
A Coletiva do Rio Combahee (Combahee River Colective) foi um grupo feminista negro localizado na cidade de Boston cujo nome veio da ação guerrilheira inventada e dirigida por Harriet Tubman em 12 de junho de 1963, na região Port Royal do estado da Carolina do Sul. Esta ação liberou mais de 750 escrav@s e é a única campanha militar na história americana planejada e dirigida por uma mulher.

 

Somos uma coletiva de feministas Negras [1] que estiveram se juntando desde 1974. Durante este tempo estivemos nos envolvendo no processo de definir e clarificar nossa política, e ao mesmo tempo estivemos fazendo trabalho político em nosso próprio grupo e em coalizão com outras organizações e movimentos progressistas. A declaração mais geral de nossa política neste momento seria a de que estamos comprometidas a lutar contra a opressão racial, sexual, heterossexual e classista, e que nossa tarefa específica é o desenvolvimento de uma análise e prática integradas baseadas no fato de que os sistemas maiores de opressão se interligam. A síntese dessas opressões criam as condições de nossas vidas.

Como Negras vemos o feminismo Negro como o lógico movimento político para combater as opressões simultâneas e múltiplas que enfrentam todas a mulheres de cor.

A seguir discutiremos quatro temas importantes: (1) A gênese do feminismo Negro contemporâneo; (2) no que acreditamos, por exemplo, no campo específico da nossa política; (3) os problemas em organizar as feministas Negras, incluindo uma breve “herstoria” [2] de nossa coletiva e (4) os temas e a prática feminista negra.

 

1. A Gênese do feminismo Negro contemporâneo

 

Antes de apresentar o recente desenvolvimento do feminismo Negro gostaria de afirmar que localizamos nossas origens na realidade histórica das mulheres afro-americanas [3] e sua luta contínua de vida ou morte para sua Sobrevivência e libertação. A relação excessivamente negrativa da Negra com o sistema político estadounidense (um Sistema manejado pelo homem branco) sempre foi determinada pela nossa categorização em duas castas oprimidas: a racial e a sexual. Angela Davis indicou em “Reflexões sobre o papel da mulher Negra em uma comunidade de escravos” que as Negras sempre incorporaram, mesmo que somente em sua manifestação física, uma postura adversária ao mando do homem branco e estiveram resistindo ativamente às incursões sobre elas e suas comunidades de maneira tanto dramática quanto sutis. Sempre houveram Negras ativistas – umas conhecidas como Soujourner Truth[1], Harriet Tubman[2], Frances E. W. Harper,[3] Ida B. Wells Barnett[4] e Mary Church Terrel[5], assim como mil tantas outras não conhecidas que compartiram seu reconhecimento de que a combinação da sua identidade sexual e identidade racial faz única sua situação vital total tanto como o enfoque de suas batalhas políticas. O feminismo negro contemporâneo é um reflorecimento de incontáveis gerações de sacrifício pessoal, militância e trabalho por parte de nossas mães e irmãs.

Uma presença feminista Negra se há desenvolvido mais claramente em conexão com a segunda onda do movimento da mulher angloamericana que começou pelos últimos anos dos ’60. As Negras, outras terceiromundistas e trabalhadoras se comprometeram ao movimento feminista desde seus princípios, mas as forças reacionárias exteriores tanto como o racismo e elitismo dentro do mesmo movimento serviram para obscurecer nossa participação. Em 1973, feministas Negras, principalmente as radicadas em Nova Iorque, sentiram a necessidade de formar um grupo feminista Negro separado. Este veio a ser a Organização Nacional Feminista Negra (The National Black Feminist Organization – NBFO).

A política feminista Negra também tem uma conexão evidente com os movimentos para a libertação Negra, em particular os das décadas de 60 e 70. Muitas de nós participamos nos movimentos (Direitos Civis, Nacionalismo Negro, As Panteras Negras) e todas nossas vidas foram afetadas e transformadas por suas ideologias, suas metas, e as táticas empregadas para alcançá-las. Nossa experiência e desilusão com esses movimentos de libertação, tanto como a experiência nas margens esquerdistas masculinas dos brancos, nos levou a ver a necessidade de desenvolver uma política que fosse anti-racista, à diferença das mulheres brancas, e anti-sexista, à diferença dos homens Negros e brancos.

Sem dúvida também há uma gênese pessoal no feminismo Negro, isso é, o reconhecimento político que emerge das experiências aparentemente pessoais das vidas individuais das mulheres Negras. As Feministas Negras e muitas mais Negras que não se definem como feministas experimentaram a opressão sexual como um fator constante em nossa existência cotidiana. Como meninas percebemos que eramos diferentes dos homens e que eles nos tratavam distinto. Por exemplo, ao mesmo tempo que nos faziam calar-nos para que nos vissem como “damas” e para nos fazermos mais admissíveis aos olhos da gente branca. Enquanto crescíamos nos demos conta que a ameaça de abuso físico e sexual por parte dos homens. A pesar de tudo, não tínhamos nenhuma maneira de conceptualizar o que era tão óbvio para nós, que sabíamos o que em realidade sucedia.

As Feministas Negras frequentemente falam de seus sentimentos de loucura de reconhecer os conceitos da política da sexualidade, do mando patriarcal, e mais importante, o feminismo, o análise político e a prática que nós as mulheres usamos para lutar contra nossa opressão. O fato de que a política racial e claramente o racismo são fatores que penetram em nossas vidas não nos permite a nós nem a maioria das mulheres Negras, ver mais a fundo dentro de nossas experiências e, a partir de esta conscientização desenvolvida e compartilhada, construir uma política que transformará nossas vidas e inevitavelmente dará fim a nossa opressão. Nosso desenvolvimento também está submetido à atual posição política da gente Negra. A geração da juventude Negra que seguiu à segunda guerra mundial foi a primeira que pode tomar a menor vantagem de certas opções educativas e de emprego, antes totalmente fechadas à gente Negra. Como resultado dessas poucas opções, nossa posição econômica ainda está pelo chão da economia capitalista norte-americana, umas poucas de nós pudemos obter conhecimentos que nos permitem lutar contra nossa opressão de maneira eficaz.

Uma combinada posição anti-racista e anti-sexista nos juntou inicialmente e, enquanto nos desenvolvíamos politicamente nos dirigimos ao heterossexismo e à opressão econômica sob o capitalismo.

 

2. No que acreditamos

 

Sobretudo, nossa política brotou primeiramente da crença compartida de que as Negras somos inerentemente valiosas, que nossa libertação é necessária, não como adjunto à de alguém mais, mas devido a nossa necessidade de autonomia como pessoas humanas. Isso pode parecer tão óbvio como para soar simples, mas é aparente que nenhum outro movimento ostensivelmente progressista considerou nossa opressão específica como prioridade nem trabalhou seriamente para acabar com essa opressão. Só nomear os estereótipos pejorativos atribuídos às Negras (por exemplo mammy/niñera Negra, matriarca, Sapphire, puta, bull-daggar/sapatão) sem categorizar o tratamento cruel, frequentemente sanguinário, indica o tão pouco valor que foi dado a nossas vidas durante quatro séculos de escravidão no hemisfério ocidental. Reconhecemos que a única gente a quem importamos o suficiente para trabalhar por nossa libertação somos nós mesmas. Nossa política nasce de um amor saudável por nós mesmas, nossas irmãs, nossa comunidade que nos permite continuar nossa luta e trabalho.

Este enfoque sobre nossa própria opressão está incorporado ao conceito depolítica de identidade. Acreditamos que a política mais profunda e potencialmente a mais radical se deve basear diretamente em nossa identidade, e não no trabalho para acabar com a opressão de outra gente. No caso das Negras este conceito é especialmente repugnante, perigoso, e ameaçante, e portanto revolucionário porque é óbvio ao ver de todos os movimentos políticos antecedentes ao nosso que neles qualquer outra pessoa merece a libertação mais que nós mesmas. Rechaçamos pedestais, ser rainhas, ou ter que caminhar dez passos atrás. Ser reconhecidas como humanas, igualmente humanas, é suficiente.

Nós acreditamos que a política da sexualidade sob este sistema patriarcal se assenhora da vida das vidas das mulheres Negras tanto como a política de classe e raça. Também encontramos difícil separar a opressão racial da classista e da sexual porque em nossas vidas as três são uma experiência simultânea. Sabemos que não existe uma coisa tal como uma opressão racial-sexual que não seja somente racial ou somente sexual; por exemplo, a história da violação das Negras por homens brancos como uma arma da repressão política.

Embora sejamos feministas e lesbianas, sentimos solidariedade com os homens Negros progressistas e não defendemos o processo de fraccionamento que exigem as mulheres brancas separatistas. Nossa situação como gente Negra requer que tenhamos uma solidariedade pelo fato de ser da mesma raça, a qual as mulheres brancas evidentemente não necessitam ter com os homens brancos, a menos que sea sua solidariedade negativa como opressores raciais. Lutamos juntas com os homens Negros contra o racismo, enquanto também lutamos com homens Negros sobre o sexismo.

Reconhecemos que a liberação de toda gente oprimida requer a destruição dos sistemas político-econômicos do capitalismo e do imperialismo tanto como o do patriarcado. Somos socialistas porque acreditamos que o trabalho tem que se organizar para o benefício coletivo dos que fazem o trabalho e criam os produtos dele, e não para o proveito dos patrões. Os recursos materiais tem que ser distribuídos igualmente entre tod*s que criem esses recursos. Não estamos convencidas, no entanto, que uma revolução socialista que não seja também uma revolução feminista e anti-racista nos garantirá nossa libertação. Chegamos à necessidade de desenvolver um entendimento das relações entre classes que tome em conta a posição específica da classe das Negras que geralmente estão nas margens da força operária, embora durante este tempo em particular algumas de nós sejamos percebidas duplamente como símbolos desejáveis nos níveis funcionários e profissionais.

Necessitamos verbalizar a situação real de classe das pessoas que não são simplesmente trabalhador*s sem raça, sem sexo, mas para quem as opressões raciais e sexuais são determinantes significantes em suas vidas laborais/econômicas. Embora compartilhemos um acordo essencial com a teoria de Marx quanto ao que se refere às relações econômicas específicas que ele analizou, sabemos que seu análise tem que extender-se mais para que nós compreendermos nossa situação específica econômica como Negras.

Uma contribuição política que estimamos já fizemos, é a expansão do princípio feminista de que o “pessoal é político”. Em nossas sessões de conscientização, por exemplo, de muitas maneiras acabamos indo mais além das revelações das mulheres brancas porque estamos tratando as implicações de raça e classe tanto como as de sexo. Até nosso estilo como Negras de falar/testemunhar na língua Negra sobre o que experimentamos tem uma ressonância ao mesmo tempo cultural e política. Por necessidade estivemos gastando bastante energia explorando o caráter cultural e pessoal de nossa opressão porque esses assuntos nunca foram estudados antes. Ninguém examinou antes o complexo tecido das vidas das Negras.

Um exemplo deste tipo de revelação/conceptualização ocorreu em uma juntada na qual discutimos as maneiras em que nossos interesses intelectuais haviam sido atacados por nossos iguais, em particular pelos homens Negros. Todas descobrimos que porque eramos “inteligentes” também nos consideravam “feias”, isso é, “inteligente-feia” Ser “inteligente-feia” pôs em evidência que todas havíamos sido obrigadas a desenvolver nossos intelectos ao grande custo das nossas vidas “sociais”. As sanções das comunidades Negras e brancas contra as pensadoras Negras são muito altas em comparação às mulheres brancas, em particular às educadas de classe média e alta.

Como já dissemos, rejeitamos a posição do separatismo lésbico porque não é uma estratégia nem um análise viável da política para nós. Exclui demasiado e demasiada gente, em particular aos homens, mulheres e crianças Negras. Temos bastante crítica e ódio do que a sociedade fez dos homens: o que apoiam, como atuam, e como oprimem. Mas não temos a noção descabelada de que isso sucede pelo homem em si, ou seja que a anatomia masculina os faz serem como são.[4] Como Negras achamos que qualquer tipo de determinismo biológico é uma base perigosa e reacionária para construir política. Também temos que perguntar-nos se o separatismo lésbico é um análise e estratégia política adequada e progressista mesmo para aquelas que o praticam, já que somente admite as fontes sexuais da opressão das mulheres, renegando aqueles feitos de classe e raça.

3. Problemas em Organizar as feministas Negras

Durante nossos anos como uma coletiva feminista Negra, viemos tendo a experiência do êxito e da derrota, da alegria e da dor, da vitoria e do fracasso. Viemos descobrindo que é muito difícil organizar-se ao redor de temas feministas Negros, que ainda mais difícil anunciar em certos contextos que somos feministas Negras. Estivemos tratando de pensar sobre as razões pelas dificuldades, especialmente já que o movimento de mulheres brancas sigue sendo forte e cresce em muitas direções. Nesta seção discutiremos em geral alguns dos problemas que confrontamos ao organizar tanto como suas razões e também comentaremos especificamente sobre as etapas para organizar nossa coletiva.

A maior fonte de dificuldade em nosso trabalho político é que não estamos somente tratando de lutar contra uma de duas frentes de opressão, senão enfrentar toda uma extensão de opressão. Para apoiarmos não temos o privilégio racial, sexual, heterossexual, ou classista, nem temos o mínimo acesso aos recursos nem ao poder que têm os grupos que possuem qualquer destes tipos de privilégio.

O desgaste psicológico de ser uma Negra e as dificuldades que isso apresenta ao tratar de lograr uma conscientização política e ao fazer trabalho político nunca podem ser subestimadas. Nesta sociedade racista e sexista se dá muito pouco valor ao espírito das Negras. Como disse uma vez uma membra que havia recém-entrado: “Todas somos pessoas danadas somente pelo fato de sermos mulheres Negras”. Somos gente despossuída psicologicamente e a todo nível, e ainda sentimos a necessidade de lutar para mudar a condição de todas as mulheres Negras. No livro “A Busca por uma feminista Negra pela irmandade” Michele Wallace chega a esta conclusão:

“Existimos como mulheres que são Negras que são feministas, cada uma isolada por hora, trabalhando independentemente porque ainda não há um ambiente nesta sociedade remotamente admirável à nossa luta – por que ao estar tão abaixo, tínhamos que fazer o que ninguém havia feito ainda: lutar contra todo o mundo ”.

Wallace é pessimista mas realista em seu assenhoramento da posição das feministas Negras, em particular em sua alusão ao quase clássico isolamento que todas confrontamos. Podíamos usar nossa posição baixa, contudo, para tomar um salto limpo até a ação revolucionária. Se as mulheres Negras fossem livres, isso significaria que todas as demais tinham que ser livres já que nossa liberdade exigiria a destruição de todos os sistemas de opressão.

O feminismo é, apesar de tudo, muito ameaçante para a maioria da gente Negra porque pôe em dúvida algumas das suposições mais básicas de nossa existência, por exemplo, de que a sexualidade terá que ser um determinante das relações baseadas no poder. Aqui vocês têm a definição da voz do homem e da mulher segundo um panfleto Negro dos anos 70:

“Nós entendemos que é e tem sido tradicional que o homem encabece o lar. Ele é o líder do lar e da nação porque seu conhecimento do mundo é mais amplo, seu conehcimento mais grande, seu entendimento mais pleno, e sua aplicação de essa infromação é mais sábia… Depois de tudo, é simplesmente razoável que o homem encabece o lar porque ele pode defender e proteger o desenvolvimento de seu lar… As mulheres não podem fazer a mesma coisa que os homens – por natureza funcionam distintamente. A igualdade entre os homens e as mulheres é algo que não pode suceder nem sequer no abstrato. Os homens não são iguais a outros homens, por exemplo, em habilidade, experiência ou até em entendimento. O valor dos homens e das mulheres se pode ver como o valor do ouro e da prata – não são iguais mas ambos têm muito valor. Temos que reconhecer que os homens e as mulheres se complementam porque não há uma casa/família sem um homem e sua esposa. Os dois são essenciais ao desenvolvimento de qualquer vida” [7]

As condições materiais da maioria das mulheres Negras provavelmente não as levaria a destruir os arranjos econômicos e sexuais que parecem representar a estabilidade de suas vidas. Muitas mulheres Negras têm um bom entendimento tanto do sexismo como do racismo, mas devido às constrições em suas vidas não podem tomar o risco de batalhar contra ambos.

A reação dos homens Negros ao feminismo esteve sendo notoriamente negativa. Se sentem certamente mais ameaçados que as mulheres Negras pela possibilidade de que as feministas Negras nos organizemos em torno de nossas próprias necessidades. Reconhecem que não somente perderiam aliadas valiosas e trabalhadoras pra suas lutas senão que também estariam obrigados a mudar seus costumes habitualmente sexistas em como atuam entre si e em quanto oprimem às mulheres Negras. As acusações de que o feminismo Negro divide a luta Negra são dissuasões poderosas contra o desenvolvimento do movimento autônomo de mulheres Negras.

Ainda assim, centos de mulheres participaram em diversos momentos durante os três anos vigentes de nosso grupo. E cada mulher que veio, veio ao sentir uma forte necessidade de captar a qualquer nível uma possibilidade que não existia antes em sua vida.

Quando começamos a reunir-nos em 1974 depois que a NBFO teve sua primeira conferência na região oriental, não tínhamos nem uma estratégia para organiza-nos nem um enfoque. Só queríamos ver o que possuíamos. Depois de nos reunir-nos por uns meses, começamos a juntar-nos outra vez mais tarde esse ano e começamos uma toma de consciência variada e intensa. Tivemos o sentimento abrumador de que depois de anos e anos finalmente havíamos havíamos encontrado. Embora não fazíamos trabalho político como grupo, individuas continuavam sua participação na política lésbica, o abuso da esterilização e o trabalho para o direito ao aborto, as atividades do dia internacional da mulher terceiro-mundista, e o apoio ativo de Dr. Kenneth Edelin,[8] Joann Little, [9], e Inez García [10]. Durante nosso primeiro verão quando o número de membras havía baixado consideravelmente, aquelas entre nós que ficávamos nos dedicávamos a discutir a possibilidade de abrir um refúgio para mulheres agredidas na comunidade Negra (não havia nenhum em Boston naquele tempo). Também decidimos por esse momento fazermos uma coletiva independente já que tínhamos uns desacordos sérios com a posição burguesa-feminista da NBFO e sua falta de um claro enfoque político.

Também, neste momento, nos contataram feministas socialistas com quem havíamos trabalhado em atividades sobre direito do aborto. Elas queria animar-nos a assistir a Conferência Feminista Socialista Nacional em Yellow Springs [11]. Uma de nossas membras assistiu e apesar da estreita ideologia que se promovia em essa conferência em particular, reconhecemos ainda mais a necessidade de entender nossa própria situação econômica e de fazer nosso próprio análise econômico.

No outono, quando algumas membras regressaram, experimentamos vários meses de inatividade comparativa e desacordos internos que primeiro se conceptualizaram como uma divisão entre lesbianas e heterossexuais mas que também era resultado de diferenças políticas e de classe. Durante o verão, aquelas dentre nós que ainda nos juntávamos determinamos a necessidade de fazer trabalho político, e de ir mais além da toma de consciência e de servir somente como um grupo de apoio emocional. No começo de 1976, quando algumas das mulheres que não quiseram fazer trabalho político, e que também tiveram desacordos com o grupo, deixaram de comparecer por sua conta, buscamos um novo enfoque. Decidimos durante esse tempo, com a somatória de novas membras, converter-nos em um grupo de estudo. Sempre havíamos compartilhad o que líamos e algumas de nós havíamos escrito papéis sobre feminismo Negro para discutir com o grupo uns meses antes que se fizera essa decisão. Começamos a funcionar como um grupo de estudo e também começamos a discutir a possibilidade de começar uma publicação Negra feminista.

Fizemos um retiro nos finais dessa primavera que nos proporcionou o tempo para discutir a política e para resolver temas inter-pessoais. Atualmente planejamos uma coleção de escrita feminista Negra. Sentimos que é absolutamente essencial demonstrar a realidade de nossa política a outras mulheres Negras e cremos que podemos fazer isso por meio da escritura e distribuição da nossa obra. O fato de que indivíduas Negras feministas vivem em isolamento por todo o país, de que somos poucas, e de que temos algumas habilidades para escrever, imprimir e publicar nosso trabalho, nos faz querer levar a cabo projetos deste tipo como meio para organizar feministas Negras enquanto continuamos nosso trabalho político em coalizão com outros grupos.

 

4. Temas e Projetos de feministas Negras

 

Durante esse tempo juntas, estivemos identificando e trabalhando com muitos temas de particular interesse das mulheres Negras. O desdobramento totalizante de nossa política nos leva a preocupar-nos com qualquer situação que toque a vida da mulher, gente de Terceiro Mundo e trabalhador*s. Estamos, é claro, particularmente comprometidas a trabalhar nessas lutas nas quais raça, sexo e classe são fatores simultâneos de opressão. Podíamos por exemplo involucrar-nos na organização sindicalista de fábricas que empregam mulheres terceiro-mundistas, ou protestar contra hospitais que lhes cortam seus serviços de saúde, a princípio inadequados, à comunidade terceiro-mundista, ou começar um centro em um bairro Negro que trate a crise de violações. Os problemas de bem-estar social (programas estatais) e de creches também podem ser pontos de enfoque. O trabalho por fazer e os temas inacabáveis que esse trabalho representa simplesmente reflete que os aspectos de nossa opressão se filtram através de todas partes.

Os temas e projetos que membras da coletiva tiveram realmente trabalhado são o abuso da esterelização, os direitos de aborto, as mulheres agredidas, a violação e o rapto, e os serviços de saúde. Também tivemos muitas oficinas educativas sobre o feminismo Negro nas universidades, conferências de mulheres e mais recentemente à mulheres no ensino secundário.

Um tema que nos preocupa muito é que temos começado a discutir publicamente é o racismo no movimento das mulheres brancas. Como feministas Negras estamos alertas constante e dolorosamente com relação ao pouco esforço que as mulheres brancas fazem para compreender e combater seu racismo, o qual requer, entre outras coisas, mais que uma compreensão superficial do racismo, da cor, e da história e cultura Negras. Eliminar o racismo no movimento das mulheres brancas é por definição o trabalho delas, mas continuaremos a dirigir-nos ao tema e exigir que assumam responsabilidade sobre o tema.

Na prática de nossa política não acreditamos que o fim sempre justifica os meios. Muitos atos reacionários e destrutivos foram cometidos para obter metas políticas “corretas”. Como feministas não queremos jogar sujo com gente em nome da política. Acreditamos no processo coletivo e em uma distribuição de poder que não seja hierárquico dentro de nosso próprio grupo e em nossa visão de uma sociedade revolucionária. Nos comprometemos a um exame contínuo de nossa política a medida que se desenvolva, por meio da crítica e autocrítica como um aspecto essencial de nossa prática. Na sua introdução de Sisterhood is Powerfull (A Sororidade é poderosa) Robin Morgan escreve:

“Não tenho nem a menor ideia do papel que os revolucionários homens brancos heterossexuais podiam fazer, já que são a incorporação do poder na qual os interesses reacionários estão investidos”

Como feministas e lésbicas Negras sabemos que temos um trabalho definitivamente revolucionário para levar a cabo e estamos preparadas para dedicar a vida ao trabalho e luta que nos espera.

 

***

 

[Retirado do livro Esta Puente mi Espalda: Voces de las mujeres tercermundistas em los Estados Unidos].

 

Notas

 

[1] Soujorner Truth (1797?-1883) foi uma abolicionista (lutadora pela abolição da escravidão de negr*s) e ativista pró-direitos da mulher. Em um dos primeiros congressos sobre direitos da mulher em meados do século 19, revelou sua bravura para dar privas de seu sexo, proclamando “Ain’t I a woman?” (“E eu não sou uma mulher?”). Este gesto simbólico quis expôr a falha das feministas brancas da primeira onda para incorporar em sua luta os problemas das negras. Portanto, Sojourner Truth serviu de modelo para muitas feministas negras contemporâneas.

[2] Harriet Tubman (1820?-1913) foi uma escrava fugitiva, abolicionista e reformista social. É famosa pelo seu trabalho com “a resistência liberacionista” que a permitiu salvar a 300 negr*s da escravidão.

[3] Frances E. W. Harper foi poetisa popular, novelista e oradora de finais do século 19.

[4] Ida B. Wells Barnet (1862-1931) foi jornalista, conferencista e liderança dos direitos civis. Participou da fundação da NAACP (Associação nacional para o assalariamento da gente de cor) e fundou a primeira organização de mulheres sufragistas.

[5] Mary Church Terrel (1863-1954) foi professora, autora, sufragista e uma liderança dos direitos civis. Trabalhou ativamente para organizar as negras nas lutas contra o racismo e o sexismo. Ela foi instrumental em fundar a Associação Nacional de Negras em 1896.

[6] Michele Wallace, “A Black Feminist’s Search for Sisterhood” (“Uma busca Negra feminista pela Irmandade”), The Village Voice, 28 de julho de 1975, pp.6-7.

[7] Mumininas of Committee for United Newark, Mwanamke Mwananchi (The Nationalist Woman). Netwark, New Jersey, 1971, pp. 4-5.

[8] Doutor Kenneth Edellin foi um obstetra e ginecólogo negro do Hospital da Cidade de Boston. Sem apoio dos administradores hospitalários, ele e seus colegas progressisas trabalham horas extras sem pagamento para prover abortos a mulheres de bairros próximos pobres porque os pedem. Em 1973 acusaram-no de homicídio involuntário por fazer um aborto ilegal a uma garota negra de 17 anos que pediu o procedimento e que não sofreu nenhum dano como resultado. “Creio muito frequentemente no direito de uma mulher de determinar o que lhe passe a seu próprio corpo”, declarou o doutor Edelin. “Se uma mulher não está convencida em sua própria mente de que quer um aborto… não o farei”. Em fevereiro de 1975, Edelin foi declarado culpado por um jurado de doze brancos, em sua maioria homens e católicos, e condenado a um ano de liberdade vigiada. (The Guardian, Nova Iorque, 19 e 26 de fevereiro de 1975). Enquanto que a hierarquia católica mobilizava seus partidários anti-feministas para apoiar o castigo de Edelin, o movimento das mulheres feministas de Boston se mobilizou para defendê-lo. No processo subsequente, se exonerou ao doutor Edelin, que depois recebeu uma promoção.

[9] Joann Little foi uma negra de 20 anos encarcerada no condado de Beaufort no estado da Carolina do Norte. Em agosto de 1974, um guarda branco de 62 anos entrou em sua celula e tentou violá-la. Ela resistiu e resultou que o matou a punhaladas. Acusada de homicídio, recebeu o apoio e solidariedade dos liberais, radicais e especialmente do movimento de mulheres através do país. Em agosto de 1975 a exonerou um jurado de seis negr*s e seis branc*s. “Pode ser que já haja uma lei que diz que uma negra tem direito a defender-se”, declarou. “O fiscal tinha mais interesse em mandar as mulheres negras à câmara de gás que à justiça” (The Guardian, Nova Iorque, 27 de agosto de 1975). “… Nunca fui pessimista com respeito ao poder do povo. Sabia que uma vez que se juntasse o povo, venceríamos”.

[10] Inez García foi acusada na Califórnia em 1975 do homicídio de Miguel Jiménez. Jiménez foi amigo de Louis Castillo, 17, que segundo Inez García a violou com ajuda ativa de Jiménez. Seu primeiro juízo resultou em um julgamento de culpada. Mas depois o julgamento foi anulado pela corte superior de California, assim que se a exonerou.

[11] A Conferência Feminista Socialista Nacional foi levada a cabo em Yellow Springs, Ohio em julho de 1975. Assistiram umas 1600 mulheres socialistas e feministas com diferentes perspectivas políticas de muitas partes de Norte-America. Um grupo de mulheres marxistas e anti-feministas tentou dominar a conferência e evitar qualquer discussão teórica do feminismo socialista. Por isso, se formaram espontâneamente várias caucuses (grupos de base), inclusive uma grande junta de lésbicas, para enfrentarem as questões que tocavam a maioria das presentes.

 

[1] O Uso em maiúscula da palavra “Negra” é uma convenção linguística nos Estados Unidos e aprte do movimento de Libertação dos Negros nos sessenta.

 

[2] O termo “Herstory” é uma forma de reinventar o termo “History”, que traduzindo se lê “História”. Porque “his” em inglês é o pronome masculino “Ele” em tradução literal. As feministas vêm usando a palavra “Herstory” (História dela, tradução literal) que soa como um trocadilho e de modo a questionar a história androcêntrica e a versão masculina prevalescente dos fatos, assim como modo de recuperar uma “história nossa” própria.

 

[3] Pensei intervir aqui e pôr “afro-norte-americanas” mas como o texto é retirado de uma coletânea de mulheres terceiromundistas e pertence a essa tradição (chicana, afro-latina, caribenha, migratória nos EUA) eu mantive americana no sentido do continente América, espero que *s leitor* s possam lê-lo assim com ajuda desta nota. [A Editorial]

 

[4] Provavelmente aqui a coletiva se refere ao clima que Feminismo Lésbico Cultural deu lugar nos 70, embora o que possa ser extraído das correntes com enfoque mais político se refere mais à necessidade de éticas lésbicas e espaços próprios (Sarah Lucia Hoagland, Marilyn Frye), estas possuíam um análise mais histórico. Em geral o clima do separatismo cultural deu lugar a discursos mais essencialistas e mesmo de uma espiritualidade feminista, que acredito terem sido mais uma reação ao centrismo masculino social e histórico e a lesbofobia do movimento feminista, narrativas essencialistas que eu vejo mais como uma necessidade de criar contra-narrativas e contra-cultura, coisa que sempre existiu durante a trajetoria dos feminismos (Monique Wittig, que publicou livros como Dicionário das Amantes e As Guerrilheiras, com largo linguagem mítico, lírico e metafórico, apesar de ter livros muito teóricos). A crítica é bem entendível mas me preocupo com a apropriação possível que possa ser feita por parte de misóginos ou quem a reproduza a despeito de conhecer ou não o contexto da crítica. Algumas separatistas lésbicas negras que podemos citar: Jacqueline Anderson, Anna Lee, Naomi Littlebear Morena, Pipa Flemming.

Às Feministas Brancas

10-Jan-15
de Carol Camper
Este é um manifesto de uma escritora lésbica Negra que enfrenta o racismo de feministas brancas.

Vocês simplesmente não conseguem lidar com a gente tendo qualquer poder real.

SEU RACISMO ESTÁ APARECENDO quando nós somos invisíveis para vocês; um pensamento posterior para integrar suas organizações brancas.

SEU RACISMO ESTÁ APARECENDO quando em raiva frustrada você não entende porque não vamos fazer o seu trabalho sobre racismo por você. Faça vocês mesmo. Se eduque. Não peça para outra mulher negra te explicar tudo de novo. Leia um livro.

SEU RACISMO ESTÁ APARECENDO quando você presta atenção demais em nós. Nós ressentimos seu olhar examinador que revela o quanto somos esquisitices para vocês.

SEU RACISMO ESTÁ APARECENDO no seu medo covarde de nós; quando vocês mandam alguém para falar conosco em seu nome, talvez outra irmã, quando resolução de conflitos conosco significa chamar a polícia. Quando você ignora o que a polícia faz com pessoas Negras e os chama mesmo assim, seu racismo está aparecendo.

SEU RACISMO ESTÁ APARECENDO quando você abraça ansiosamente a mulher Negra solitária no seu coletivo, enquanto teme ressentindo, suspeitando e atacando um grupo vocal e assertivo de mulheres Negras. Uma mulher Negra você consegue lidar, mas mulheres Negras organizadas são um problema real. Você simplesmente não consegue lidar com a gente tendo qualquer poder real.

SEU RACISMO ESTÁ APARECENDO quando você comenta sobre nossas lindas roupas étnicas ou nos pergunta porque usamos dreads quando somos estranhas para vocês. Você faria o mesmo com um branco estranho vestindo Ralph Lauren e um page boy? Estes também são estilos étnicos.

SEU RACISMO ESTÁ APARECENDO quando você demanda saber nossa etinicidade, quando nós não aparentamos a sua ideia do que é uma pessoa Negra. Nós não somos contáveis para vocês por como nossos corpos são e nós não temos que ser “legais” com você e tolerar sua curiosidade.

SEU RACISMO ESTÁ APARECENDO quando você insiste em definir nossa realidade. Você não vive dentro das nossas peles, então não nos diga como devemos perceber o mundo. Nós existimos, assim como a nossa realidade.

SEU RACISMO ESTÁ APARECENDO quando nossa raiva te deixa em pânico. Mesmo quando não estamos com raiva de você ou do seu racismo, mas sim com algo simples e comum. Quando nossa raiva expressa se traduz a você como uma ameaça de violência, este é o seu medo de retribuição ou exposição reconhecido e isso revela a sua culpa.

SEU RACISMO ESTÁ APARECENDO quando você, por sua interferência, não vai nos permitir ter o nosso próprio espaço. Nós entendemos que você nunca esperou ter acesso negado a nada ou qualquer lugar, mas as vezes você deve ficar longe dos espaços de mulheres Negras. Você não precisa estar lá só para o caso de algo exótico estar acontecendo ou em caso de estarmos armando contra você. Nessas instâncias, vocês não são apenas presenças não-convidadas, você são infiltradas. *Este é um ato hostil.*

SEU RACISMO ESTÁ APARECENDO quando você chora, “Racismo inverso!” Isso não existe. Somente pessoas privilegiadas que nunca viveram discriminação pensam que isso pode ser “inverso”. *Isso significa que você pensa que não deveria acontecer com você, apenas com as pessoas com quem já acontecem – tipo a gente.*

SEU RACISMO ESTÁ APARECENDO quando você exclama que somos paranóicas e esperamos racismo em toda esquina. Racismo vive dentro desta sociedade num nível central. Se não estamos constantemente atentas, nós, enquanto pessoas, já estaríamos mortas a essa hora.

SEU RACISMO ESTÁ APARECENDO quando você clama que não é racista. Esta economia e cultura não existiriam sem o trabalho escravo para construí-los. A invasão e exploração das Américas dependendiam da convicção de que pessoas de cor eram menos humanas. Sem isso, não poderíamos ter sido tão cruelmente usadas. Vocês cresceram em uma sociedade racista. Como poderiam não ser racistas? Você não pode simplesmente decidir que racismo é “ruim” e portanto você não é mais. Isso não é desaprender racismo. *Pessoas Negras não podem ser tão ingênuas.*

SEU RACISMO ESTÁ APARECENDO quando você pensa que todos os racistas são Nazis carregando cartas, ignorantes e violentos. Você está se enganando, mas não a nós, se você pensa que racismo se refere às ações e atitudes desconectadas e isoladas de pessoas más. A maior parte dos racistas são pessoas legais, especialmente neste país. Racismo é sistêmico e não pode ser separado desta cultura.

 

Nós não queremos testemunhar ou secar suas lágrimas. Sim, racismo machuca. Machuca você, mas por favor não cogite a noção de que machuca você tanto que nos machuca. Racismo *NOS MATA* não a vocês. Suas lágrimas não vão ganhar nossa simpatia. Nós não somos mais sua propriedade, portanto não precisamos mais tomar conta de vocês. Nós não queremos ver sua patetice, então pegue o seu trabalho com racismo para o seu lugar e o faça por lá.

ÀS FEMINISTAS BRANCAS, SEJAM VOCÊS LIBERAIS, RADICAIS, SEPARATISTAS, RICAS, OU NÃO – SEU RACISMO ESTÁ APARECENDO. VOCÊ PODE ESPERAR OUVIR DE MULHERES NEGRAS VOCAIS E ORGANIZADAS QUE ESTARAM MOSTRANDO EM SUA FRENTE.

 

Carol Camper é uma escritora lésbica Negra, artista visual, mão, e trabalhadora da saúde da mulher. Ela publicou em várias antologias e jornais. Ela é a editora de uma antologia de Mulheres Mestiças, publicada pela Sister Vision Press.

 

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“There can be no black-white unity until there is first some black unity. There can be no workers’ solidarity before there is first some racial solidarity. We cannot think of uniting with others, until after we have first united among ourselves. We cannot think of being acceptable to others until we have first proven acceptable to ourselves. One can’t unite bananas with scattered leaves.” – Malcolm X

 

“Não pode haver união entre brancos e Negros enquanto não houver união entre Negros. Não pode haver solidariedade com os trabalhadores antes que haja alguma solidariedade racial. Não podemos pensar em nos unir com os outros, até que tenhamos nos unido entre nós. Não podemos pensar em sermos aceitáveis para os outros até que tenhamos provado que somos aceitáveis a nós mesmos. Não podemos unir bananas sem folhas dispersas.” – Malcom X

 

Texto original extraído de:http://permalink.gmane.org/gmane.politics.communism.environmental/12417